ALICE ALVES NUNES nasceu no Rio de Janeiro a 7 de setembro de 1896. Casou-se com o advogado Jayme Gonçalves Nunes. Lecionou a vida toda. Em 1964 lançou "Cigarras do Meu Inverno" (poemas e trovas). Alice residiu à Rua Conde de Itaguaí, 55, casa 15, aptº 101, Tijuca-RJ.
Nasci depois da alforria,
no entanto, escrava sou eu;
escrava da nostalgia
que a raça negra me deu.
Velha saudade que enfeixas
minhas trovas tão banais,
tens muito de riso e queixas
de quem já viveu demais.
Natal – o presépio armado
na sala. Quanta alegria!
Hoje as sombras do passado
enchem a sala vazia.
Diz ser amarga a fatia
do pão que come, e nem vê
que do seu pão, cada dia,
quem faz a massa é você.
Vida e amor! Bendigo a sorte
por tal graça a mim cedida;
a vida passa a ser morte,
quando falta amor na vida.
Mentira é dizer que opostos
não vibram em sintonia:
riso e lágrimas são postos
dentro da mesma alegria.
Despedida... Mesma cena
no mundo, em qualquer país:
um lenço branco que acena,
silêncio que tudo diz.
Lágrimas de mãe, iguais
ante o Supremo Senhor;
quer das mães dos marginais,
quer da Mãe do Redentor.
As leis humanas são falhas;
leis dos que não se irmanaram.
Chamam de heróis, dão medalhas
aos que mais irmãos mataram.
A crioula é um pancadão,
toda de verde e faceira.
Lembra o tutu de feijão
com boa couve à mineira.
Injusta dor nos assalta,
quando a tristeza provém
de um pouquinho que nos falta,
no muito que a gente tem.
Que toda pedra que rola
não cria limo, é verdade.
Toda alma que a dor imola
perde o limo da maldade.
Julgo mulher que tropeça
“tempestade que desaba”:
sabe-se quando começa;
quem sabe lá como acaba?
Não faças novo vizinho
teu íntimo, de repente.
No galho em que há um ninho
pode enroscar-se a serpente.
Na vida os próprios escolhos
têm sua compensação:
melhor perder luz dos olhos
que perder luz da razão.
Nem pobre nem só. Disponho
de riqueza eterna e nova:
no meu palácio de sonho,
tenho a presença da trova.
De quem vai por mau caminho
com o fim de subir, tem dó!
Pó que se ergue, em torvelinho<
mesmo no alto, ainda é pó.
No seu quarto fiz limpeza,
mas dele, vovó, quem há de
tirar cinzas de tristeza,
limpar teias de saudade?
Morta a filhinha, lhe deram
um mausoléu de valor.
Quanto mármore puseram
para guardar uma flor!
Eu sou hoje mãe que peca
pois esta pergunta é minha:
Deus não brinca com boneca,
por que te levou, filhinha?
Por que lágrimas e tantas?!
A mamãe vai ficar boa...
São essas mentiras santas
que o bom Deus ouve e perdoa.