A Sogra (palestra em trovas)

                                    A  SOGRA

 

          Figura eternamente polêmica e controversa nas rodas de trova, eu não entendo porque essa discriminação contra a imagem magnânima da sogra.  Afinal é ela a mãe da "musa"... ou "muso", e avó dos filhos de quem lhe dedicou  os "mimosos" versos.  Dizem eles (ou elas) que tudo não passa de uma brincadeira inocente ou até mesmo uma original manifestação de amor, mas, sei lá, dizem que toda brincadeira tem um fundo de verdade.  Será?

         Tudo começou, segundo Renata Paccola (trovadora de São Paulo), no ano de 1.500, quando:

 
Retornando a Portugal
depois da grande conquista,
vendo a sogra em seu quintal,
diz Cabral: "encrenca à vista"!

 

         Enquanto viva, implicam o tempo todo com a pobre.  A Magdalena Léa, por exemplo, não queria nem que ela dirigisse:

 
Minha sogra, aquela bruxa,
num fusca, mandando brasa!
E eu fico pensando: puxa!
Com tanta vassoura em casa!

 

          E o Simeão Cohen chegou ao cúmulo de subtrair-lhe o veículo. Depois tentou se defender:

 
Não foi pilhagem... troquei
com minha sogra, certinho:
peguei seu fusca e lhe dei
uma vassoura... Zerinho!

  
         Já a Marilúcia Rezende ficou impressionada com a sinceridade de certo rapaz e o descreveu assim:

 
Até na pressa ele é franco...
Num raciocínio ligeiro,
coloca as malas no banco 
e a sogra no bagageiro!!!

          Isso é que é "amá-la"!  Na sapataria do Pedro Ornellas é outra confusão:

  
Esbanjando-lhe o dinheiro
suado e curto de fato,
a sogra do sapateiro
é uma "pedra no sapato". 

           E a Heloisa Zanconato, de Juiz de Fora, ficava desconfiada até quando a velha, na mais santa das intenções, convidava-a para um banquete.  Isso mesmo: banquete! Porque ter sogra rica é privilégio de poucos!

 
Quando a sogra me convida
para um jantar de nababo,
eu vou certa que a comida
vai ser jiló... ou quiabo.

 

          Quando a "coroa" é chegada num "goró" então, nem lhes conto nada.  Quem vai contar é o Waldir Neves, do Rio de Janeiro:

 
A sogra adora cerveja
e o genro – maldade só --
no copo, sem que ela o veja,
despeja pimenta em pó.
 

           Quanto ao Valdez, como médico e pesquisador incansável ele descobriu a origem da anomalia chamada "loucura": 
Que pena! Ficou pirado:
mordeu alguém outro dia
e agora sofre, o coitado,
da tal de "Sografobia"...

 

            E já que falamos em médico pesquisador, o engenheiro Arlindo Tadeu nos informa que existe um cientista lusitano que não agüenta mais a velha:

 
É catarata... enfisema...
Minha sogra é problemática! 
A velha tem mais problema 
que prova de Matemática!

 
            Chateado ele resolveu então usá-la como cobaia numa experiência inédita:

 
Ante a clonagem, desmaia 
o cientista pouco esperto: 
fez a sogra de cobaia 
e a experiência deu certo!

 
             Se ela, cansada de tanta humilhação, resolve ir ao "campo santo" orar pelo falecido e pedir ajuda, chega o maquiavélico Edmar Japiassú Maia e faz aumentar seu inferno astral:

 

Pelo sufoco constante,
se ao cemitério ela vai,
põe crachá de "VISITANTE,

pois, senão, de lá não sai!

 

             Por essas e por outras é que existe sempre uma conspiração no sentido de "apagar a velhinha".  A começar pela triste narrativa do Carlos Henrique:

 

Vendo a sogra no sufoco, 
quase morrendo afogada, 
o Fragoso deu-lhe o troco,
jogando a bóia furada...

 

         Enquanto isso o Izo Goldman teria presenciado a seguinte cena:

 
Vendo a sogra na calçada 
o genro, lá da janela,
dá num vaso uma "esbarrada"...
e acerta a cabeça dela!!!
 

           Mas se o bom senso manda agir com sutileza, o Sérgio Bernardo, de Nova Friburgo,  segue à risca as determinações e resolve livrar-se para sempre da megera, construindo-lhe um imóvel:

 
Se um convívio não logra,
resolve a encrenca "no tranco":
faz o barraco da sogra
bem debaixo do barranco!

 

            Quando, finalmente, para alívio de tantos, ela"bate as botas", descobrem, horrorizados, que o perigo continua a rondar.  A Maria Lúcia Castanho, de Bandeirantes -PR, imediatamente alerta para os riscos de uma "ressurreição":

Foi um susto no velório
quando alguém gritou: "tá viva"!
E o genro, em tom vexatório: 
"Mas que velha vingativa"!

  
             E aquela "coroa" citada, lá no início, pelo Waldir Neves, que era chegada num goró, vocês estão lembrados?  Pois é:

 
Num velório alguém pergunta:
" todo mundo já bebeu?"
É quando uma voz defunta 
diz, do caixão: -- Falta eu!

  
             Era "a própria", segundo o emocionado testemunho do Orlando Brito, de São Luis do Maranhão, um dos mais ferrenhos "defensores" das simpáticas senhoras vestidas de preto e portando vassouras.  Agora notem o inconformismo do Pedro Viana Filho ao sentir-se ludibriado em sua boa fé:

Minha sogra deu chilique,
fez careta, emudeceu...
Tudo farsa, foi trambique:
fez a cena e não morreu!

 

            Mas como os trovadores são muito irmãos e solidários, entrou em cena o Sérgio Ferreira da Silva e, embora sem sucesso, forçou a barra, tentando subornar o coveiro:

O coveiro disse enfim:
"não quero ser encrenqueiro...
Eu enterro a sogra sim...
mas... tem que morrer primeiro!

   
             Foi então que o Pedro Ornellas apelou feio... E depois ainda tentou sair de fininho:

TERRAMICINA??? Que horror!!! 
Depondo, o genro "lastima":
lendo a receita, doutor,
eu entendi  "TERRA EM CIMA"!

 

            E depois que finalmente a infeliz morre mesmo, pensam que acabou o suplício?  Pois o Sérgio Ferreira (o mesmo que tentou subornar o coveiro) garante que não:

  
Alheia ao calor eterno
a Sogra, por vocação,
tão logo chegou no Inferno,
assumiu a... Direção!

 

             Vejam a que ponto chegou a incompreensão humana:  transformaram a figura da sogra num autêntico boneco de Judas.  A realidade é que, mesmo embriagados, esses carrascos não largam do pé das coitadas.  Prova disso é o depoimento horrorizado do Gerson César de Souza de São Mateus do Sul/PR:

Vendo as listras do pijama

que vestia Dorotéia,
seu genro, bêbado, exclama: 
-- a zebra engoliu a veia!!!

 

            Vou lhes confessar uma coisa:, sinto-me profundamente indignado porque, a meu modo de ver:

Sogra é figura impoluta
se olharmos desta maneira:
ninguém pode amar a fruta
e contestar a fruteira!

 

             Bom... pelo menos até há pouco tempo era o que eu pensava, porque agora também mudei de idéia, depois da última que a velha me aprontou: 

Casando-se com meu pai, 
(vejam que idéia nefasta!)
além de sogra, ela vai

ser também minha madrasta!!!?

 

         Depois desta, só mesmo imitando aquele comentarista esportivo de sotaque sertanejo: - Ah, para, vai!