Para Maria Thereza Cavalheiro

GIRÂNDOLA

Colaboração de Amaryllis Schloenbach para o site www.falandodetrova.com.br

Endereço para contato: amarylliss@uol.com.br

Setembro 2019 - Homenagem póstuma a MARIA THEREZA CAVALHEIRO

Com a chegada de setembro, época da volta da primavera, da Natureza nos brindar, de novo, com lindas flores, paisagens ensolaradas e alegres sons dos pássaros no ar, venho trazer à lembrança a figura de Maria Thereza Cavalheiro, que exatamente no dia dois deste mês, no ano passado, deixou o nosso convívio para ir ao encontro de tantos outros trovadores amigos, que já se foram, mas não sem antes nos ensinar, através de inspiradas trovas, a saborear a riqueza de sentimentos a que esse gênero poético nos abre o horizonte.

Ela foi não só uma de nossas maiores trovadoras, como também desde jovem, uma grande pesquisadora do assunto, que ao entrevistar o imortal Jorge Amado, dele coletou a famosa declaração que está presente, nem sempre em sua forma completa, em inúmeras citações, em incontáveis obras de trovadores de todo esse nosso Brasil:

" Quem quiser que diga que a trova é um gênero menor de poesia... Para mim não há gênero menor nem maior: sendo o poema belo, não importa o gênero, ele é maior pois nada existe de comparável à poesia, não pode haver criação literária mais popular, que fale mais diretamente ao coração do povo. É através da trova que o povo toma contato com a poesia e sente sua força. Por isso mesmo a trova e o trovador são imortais".

Maria Thereza foi uma grande incentivadora dos trovadores, e manteve colunas de trovas em vários jornais e revistas de nosso País. A mais duradoura, que teve início em outubro de 1977, no jornal mensal "O Radar" de Apucarana-PR, só foi descontinuada 41 anos depois, em 2018, com seu falecimento.

Divulgou uma grande plêiade de trovadores através de seu trabalho voluntário junto à fábrica das "Gotas de Pinho Alabarda", com a seleção e coleta das respectivas autorizações dos trovadores, que tinham seus versos setissílabos reproduzidos nos adesivos, que acompanhavam as deliciosas e populares balas.

Publicou inúmeros artigos sobre o assunto em vários jornais e revistas de grande tiragem em nosso País, além de engrandecer a trova sempre que era solicitada a dar entrevistas. Apresentou um quadro literário na TV Gazeta, dentro do programa "Linfor em Tempo de Mulher", compareceu a programas de rádio, em várias emissoras de São Paulo. E teve, durante sua presidência, várias das reuniões e eventos da UBT, de São Paulo, televisionados e ou comentados, nos principais jornais, bem como na laboriosa e abnegada imprensa alternativa de todo Brasil.

Dava especial atenção aos iniciantes, e vibrava feliz, a cada vitória de um de seus pupilos. Ensinava, pessoalmente, por telefone, por correspondência, por artigos em revistas, através de livros, com métodos bem simples e didáticos. Era completamente sincera, tanto nas críticas construtivas, quanto nos elogios incentivadores. Movimentava uma vasta cadeia de correspondentes, inclusive em Portugal.

Nos últimos anos, vinha colaborando com "Falando de Trova", um dos baluartes do nosso movimento trovadoresco, através da coluna "Herança Poética", onde transcrevia pequenas joias de nossos trovadores já falecidos, as quais garimpava em seus recheados arquivos.

Ainda em relação ao seu ativismo, ela foi também uma das pioneiras das campanhas ecológicas com "Vamos Vestir São Paulo de Flores", nos tempos da garoa paulistana... Recebeu várias honrarias pela sua constante luta pela preservação do elemento Verde.

Escreveu inúmeras trovas belíssimas sobre o assunto, e durante décadas pesquisou sobre as plantas e sua importância na preservação da vida no nosso planeta. Culminou esse dedicado trabalho com a publicação magnífica do livro paradidático "Nova Antologia Brasileira da Árvore". O que lhe valeu o apelido de "Maria Floresta"... No entanto, seu mais recente trabalho "Consciência Ecológica na Educação" (2014) não chegou a ser publicado ainda, porque na época, o contrato com a Editora foi adiado por conta do panorama financeiro que já apontava para a recessão. Tenho fé que virá a lume, inclusive pela atualidade da proposta.

A Escritora obteve inúmeros prêmios em trovas, mas também muitos outros prêmios em poesias, contos, poemetos, dísticos, no Brasil e em Portugal. E além de seus vários livros publicados, deixou outros tantos trabalhos inéditos, que estão sob minha guarda, para possível publicação. Fui chamada de sua "fiel escudeira" e muito me orgulho de ter estado ao lado dessa admirável Artista, desde a mais tenra infância, e de ter sido sua discípula, amiga e confidente, além do parentesco, sobrinhas-netas que somos, da saudosa pioneira Colombina.

Graças a essa convivência, inclusive fomos colegas de trabalho, afirmo que Maria Thereza Cavalheiro, foi uma criatura do Bem, que não permitiu que a grande tragédia de sua vida a tornasse uma pessoa revoltada, traumatizada, infeliz. Pelo contrário, seu coração era tomado de uma fé inabalável em Deus e no Amor pela humanidade, sempre disposta a ajudar ao próximo. Não só a mim, seu sangue, mas também aos amigos, aos colegas e até mesmo aos estranhos.

Diz a lenda, que a ave mãe pelicano, quando não encontra nada para dar de comer aos seus filhotes, belisca com o bico seu próprio peito para ter com que alimentá-los. Assim era Maria Thereza Cavalheiro, grande alma, uma benemérita, que tem em sua lápide a trova de sua autoria que melhor a define:
"Morte é vida superior
e partiremos felizes
se puder sempre uma flor
brotar de nossas raízes.//

Vamos homenageá-la com trovas de alguns de seus confrades mais afetuosos e mais presentes em sua vida literária:

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Trovas... A muitos parece
que são fáceis de compor:
talvez sejam, mas carece
ter alma de trovador.
COLOMBINA
 
Vive cá dentro da gente
mas bem mal a gente externa:
- Saudade é morte aparente...
E a Morte - Saudade eterna...
LUIZ OTÁVIO
 
No vaivém da vida a gente
muitos percalços aguenta,
porque a fé, seguramente,
é a força que nos sustenta.
ANALICE FEITOZA DE LIMA
 
Guia o nauta e o peregrino,
rege os nobres e os plebeus.
- É que o dedo do destino
faz parte da mão de Deus!
APARÍCIO FERNANDES
 
A cadeira sem balanço,
a rede em triste orfandade...
uma se rende ao descanso,
a outra embala a saudade.
DOROTHY JANSSON MORETTI
 
Mão côncava de quem pede,
mão convexa de quem dá:
o medo que se tem é de
saber o que nelas há.
GUILHERME DE ALMEIDA
 
Contemplo, além, as estrelas,
num sonho muito bonito:
- quem dera que, ao conhecê-las,
visse vocês no Infinito!
ZÊNITH FEITOSA 
 
No porto da longa vida,
aportam longas idades;
os barcos chegam da lida
e descarregam saudades.
ABGUAR BASTOS
               
O rio seguindo sempre,
vai o oceano encontrar;
trovador morre cantando,
porque não pode chorar.
ANTONIETA BORGES ALVES
 
Nunca te esqueço, Maria,
nunca te esqueço, Thereza,
se estás longe, que tristeza,
se estás perto, que alegria!
BENEDITO R. ARANHA
 
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Eu gosto de andar nos rastros
dos que no céu se mantêm:
quem vai na cauda dos astros
ganha luz própria também!
JOSÉ OUVERNEY
 
De quem se parte e reparte,
só uma parte segue em frente...
Com cada amigo que parte,
parte uma parte da gente!
PEDRO ORNELLAS
 
Tenho certeza que a trova
- poema feito de amor -
É um sonho que se renova
na vida de um trovador.
FILEMON MARTINS
 
Passa o tempo... e enquanto corre,
a lembrança vai sumindo...
Mas a saudade não morre:
- Apenas fica dormindo...
PEDRO MELO
 
O tempo é uma chalaça,
ou muito nos enganamos...
Ele só finge que passa,
nós, porém, é que passamos!...
SILVÉRIO DA COSTA
 
Após tantas despedidas,
são tantos os reencontros,
que nas emoções vividas
dissipam-se os desencontros.
JOSÉ FELDMAN
 
Os poetas e os vulcões
têm almas da mesma essência:
a calma em seus corações
é calma... só na aparência.
SÉRGIO FERREIRA DA SILVA
 
Na porta da eternidade,
documento não tem vez.
- O cartão de identidade
é o bem que em vida se fez!
A. A. DE ASSIS

Com empenho e grande fé,
tenaz na lapidação,
a Poeta mostra quem é,
porque transmite emoção.
CLARICE VIEIRA LINCK 
       
Esta estocada profunda,
que me rouba a paz e a calma,
irrompe meu peito e inunda
desta saudade minha alma!
AMARYLLIS SCHLOENBACH