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(texto de José Fabiano, mineirim de Uberaba)
EPIGRAMA
Geir Campos, em seu PEQUENO DICIONÁRIO DE ARTE POÉTICA, assim define o epigrama:
“Composição poética breve e satírica, expressando um conceito ou pensamento malicioso da maneira mais incisiva.” E continua: “Sainz de Robles, no seu DICIONÁRIO DE LA LITERATURA, escreve que ‘o epigrama é fruto serôdio das civilizações decadentes’ e conclui que ‘um guerreiro poeta lança-se à epopéia ou à écloga, mas um cortesão poeta não sabe ir além do madrigal e do epigrama’. Lessing, no EPIGRAMA, distinguia o nó em que se provoca a curiosidade do leitor e o desfecho onde essa curiosidade é atendida com o máximo de surpresa, como neste exemplo de ALBERTO RAMOS, em seu livro POEMAS, sob o título ‘A um panfletário’:
‘Os velhacos e os maus, juiz inclemente
zurzes com a pena rábica e ferina...
Só não falas de ti – pois francamente
perdes o tema de melhor verrina!’
Pela definição acima, parece-me que a Trova muito se presta à utilização do epigrama, pois a julgo veículo ideal para “composição poética breve e satírica, expressando um conceito ou pensamento malicioso da maneira mais incisiva.” Penso que a trova epigramática seria uma variante branda da “trova brincante” do Mestre A. A. de Assis.
Menciono, a seguir, alguns exemplos de epigramas de grandes poetas.
De EROTICA E CURIOSA, de J. W. GOETHE, seleção, versão portuguesa e apresentação de JOÃO BARRENTO, retiro os seguintes menos chocantes:
“Não me posso admirar de Cristo Nosso Senhor ter gostado
De viver com putas e pecadores. Pois se o mesmo se passa comigo!”
*
“Quereis então saber o que é uma espelunca? Vejo que
Em léxico quase se transforma este livro epigramático.
Casas escuras são, em vielas estreitas; uma beldade
Leva-te a tomar café, e é ela, e não tu, quem faz todo o trabalho.”
*
“Todos, filha, me dizem que me enganas.
Ah, continua sempre a enganar-me assim.”
*
Do livro CEM EPIGRAMAS ESPANHÓIS, tradução livre de SILVA TAVARES, eis alguns epigramas anônimos:
“Quando existiam bárbaras nações,
nas cruzes penduravam-se os ladrões.
Agora, neste século das luzes,
ao peito de ladrões penduram cruzes!”
*
“Um professor conhecido,
Com ênfase, a um escolar:
- Diga lá. Que tempo é amar?
- Amar... é tempo perdido!”
*
“Com certa mulher travessa
O demo, um dia, brigou.
São Pedro, que os separou,
Cortou aos dois a cabeça.
Diz-lhe Deus: - Exageraste...
Trata já de colocar,
de novo, no seu lugar,
as cabeças que cortaste.
São Pedro – e com esta acabo –
Tal fez. Mas pôs, sem querer,
Ao diabo, a da mulher
E à mulher, a do diabo!”
*
E do grande LOPE DE VEGA:
“Quis perguntar certo amante,
a um sábio extraordinário,
que seria necessário
para a Mulher ser constante.
Diz-lhe este, sem vacilar:
- Cá no meu fraco entender,
não ter olhos para ver
nem ouvidos para escutar.”
Cheguemos a Portugal. Entre outros poetas, menciono MANUEL MARIA BARBOSA DU BOCAGE. Sabe-se dos seus desencontros com o colega brasileiro DOMINGOS CALDA BARBOSA, o autor de VIOLA DE LERENO, que lhe inspiraram o que lereis a seguir.
“Dizem que o Caldas glutão
Em Bocage aferra o dente:
Ora é forte admiração
Ver um cão morder na gente!”
*
“Lembrou-se no Brasil bruxa insolente
De armar ao pobre mundo estranha peta;
Procura um mono, que infernal careta
Lhe faz de longe, e lhe arreganha o dente;
Pilhando-o por mercê do averno ardente,
Conserva-lhe as feições na face preta;
Corta-lhe a cauda, veste-o de roupeta,
E os guinchos lhe converte em voz de gente:
Deixa-lhe os calos, deixa-lhe a catinga;
Eis entre os lusos o animal sem rabo
Prole se aclama da rainha Ginga:
Dos versistas se diz modelo, e cabo;
A sua alta ciência é a mandinga
O seu benigno Apolo é o Diabo.”
*
Para terminar, transcrevo quatro trovas retiradas do livro TROVAS BRINCANTES II, de autoria de A. A. de Assis (AAA), Edmar Japiassú Maia (EJM), José Fabiano (JF) e José Ouverney (JO):
“Ora, a ordem dos fatores
Altera o produto, sim:
- ‘Adão e Eva’, louvores;
No entanto ‘Eva e Adão’ é o fim...”
AAA
*
“Em Itu, num fato inglório,
Meu amigo se estressou
Ao ver o supositório
Que o doutor lhe receitou!”
EJM
*
Ela disse: - Tudo acabado,
Esclarecendo as vizinhas.
- Confessou-me o descarado
Que “dorme com as galinhas”...
JF
*
“Casou-se com mulher feia
E, arrependido, hoje ‘apela’:
Vem do bar de cara cheia
E ainda enche a cara dela!”
JO
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