Marina Paiva Bruna Bindão

     MARINA Paiva BRUNA Bindão - Nascida na cidade paulista de Franca em 25 de janeiro de 1935, filha de Jaime Fernandes Bruna e Diva Luz Paiva Bruna, ele professor universitário, ela diretora de escola. Foi casada com Francisco José Bindão, natural de Taubaté, falecido em 1995, com quem teve os filhos Francisco e Jaime. Marina era graduada em Matemática, Pedagogia e Jornalismo. Cantora e instrumentista.  Campeoníssima de Concursos de Trovas no Brasil. Radicada há muitos anos em São Paulo e dirigente da UBT municipal e membro da Casa do Lampião. Publicou os livros: "Transparências" (poemas e trovas - 1989), "Cintilações" (trovas - 1994) e "Cantares" (300 trovas - 2010), além de participação em inúmeras coletâneas. Deixou a existência terrena no dia 16 de dezembro de 2013.

 

Velho bilhete... lembrança                   (1º lugar em Nova Friburgo em 1999) 
de um amor que não foi meu...
Um pedido de esperança
que a vida não respondeu...
 

Sabiá, guarda teu canto!
Eu sei que o dia é bem vindo
mas não despertes o encanto
que em meu leito está dormindo!

 

 

Vou te deixar... Partirei...            (trova premiada na UBT SP - 2006)
Sem saudade... Sem sofrer...
Por um motivo eu te amei;
por muitos, vou te esquecer...

 

Aqueles grãos sem valor
-- e eu fico pensando agora --
eram sementes de amor
e eu, sem querer, joguei fora...

 

Vão ficando tão distantes
os carinhos do passado,
que nem sei se o que era antes
foi vivido... ou foi sonhado...

 

No solar da poesia
há uma janela indiscreta,
por onde o leitor espia
o coração do poeta!

 

De cada galho abatido,
em silêncio a seiva escorre    (Taubaté 2006)
mostrando o pranto sentido
de uma floresta que morre!

 

Já fui Musa no passado
e hoje só, bem que eu queria    (Pouso Alegre 2003)
os versos de pé-quebrado
que desprezei certo dia...

 

Quanta família é desfeita
sem notar, que em meio aos brados,      (Pouso Alegre 2001)
há uma vítima que espreita
de olhinhos arregalados ...

 

Quis te falar... mas não pude...    (Venc. Amparo 1999)
E, então, te dei uma flor...
As flores têm a
virtude

de saber falar de amor...

 

Em meu caminho, a poesia                  (MH Pouso Alegre 1997)
não me empresta sonhos vãos.
Vou de bagagem vazia
mas tenho o mundo nas mãos!

 

Com a emoção renascida         (Venc. Conc. Guilherme de Almeida/SP 1990)
no amor que só veio agora,
o ocaso de minha vida
ganhou matizes de aurora! 

 

Que eu te esqueça... não me peças...                   (Vencedora em Niterói - 2005)     
Não me obrigues a fingir
e fazer falsas promessas
que jamais irei cumprir.

 

Vai, de saberes repleto,
um sábio pela metade.
Para ser sábio completo
faltou-lhe o grau de humildade...

 

Na história da tua vida,
sou apenas, sem escolha,
uma sentença esquecida
no rodapé de uma folha...
 

Vai com seu dono mendigo,            (1º lugar Concurso Intersedes)
dando-lhe o único alento...
E eu penso: - Este cão amigo
bem merece um
monumento!
 

Voltei, amor, já sem pranto,                        (Pouso Alegre)
sem as mágoas que levei...
A saudade pesou tanto
que antes da
esquina... eu voltei.
 

Descalços pelo gramado
teus pés mansamente vão...
Pões, no pisar, tanto agrado,
que eu tenho inveja do chão!...

 

Tua carícia atrevida,
num suave dedilhado,
musicou a minha vida
com acordes de pecado.

 

Prostrado... na dor infinda
de um desprezo que o consome,
meu coração bate ainda,
porque murmura o teu nome...

 

A vida insiste em manter
em dois tons sua canção:
o mais agudo é o poder;
o mais grave, a servidão!

 

Minha mão leve desliza
no teu corpo sensual,
como as andanças da brisa
nas plumas do capinzal...

 

Neste ano novo eu pretendo
rasgar meus dias tristonhos
e, de remendo em remendo,
reconstruir os meus sonhos...

Se um dia o céu censurar
o nosso amor, não aceito...
e a teu lado hei de encontrar
um outro céu... mais perfeito!

A tua mão deslizando

no meu corpo, em leve afago,

é como a brisa encrespando

a superfície de um lago.

 

Sobre os espelhos fanados,

o tempo, em seu transcorrer,

passa escrevendo recados

que não gostamos de ler...

 

Deus modela a nossa estrada

porém nós, em atos falhos,

modificando a jornada,

nos perdemos nos atalhos...

 

Eu faço um apelo mudo

na velhice que me alcança:

- Destino, tire-me tudo

mas não me roube a esperança!

 

Meu viver lembra uma estrada

com mistérios para mim:

do começo não sei nada...

não sei nada do seu fim...

 

Afeto infinito eu leio

nos olhos, cheios de brilho,

da mãe que desnuda o seio

e oferta seu leite ao filho!

 

Nas águas turvas dos rios,

os venenos poluidores

nos darão dias sombrios

de primaveras sem flores...

 

O destino rege as vidas

num balé, cujo andamento

lembra o das folhas caídas

dançando ao sabor do vento...

 

Nosso amor, hoje em desgaste,

fez do convívio um açoite...

Tempo! Por que não paraste

naquela primeira noite?

 

Fim do amor... mas nosso enredo

restou em minha lembrança,

como ficou em meu dedo

a marca de uma aliança...

 

Como é grande a solidão

de um ator, que em sua estréia,

põe em cena o coração

e está vazia a platéia...

 

À noite, a areia da praia,

com rendas à beira-mar,

lembra um lençol de cambraia

onde se deita o luar...

 

Tu fizeste um leve aceno

e a esperança que me deste

teve o alento de um sereno

caindo num solo agreste!

 

Vêm mais tarde os desarranjos

e nos transformam de vez

mas, na infância somos anjos

do jeito que Deus nos fez!

 

Vem setembro... e algumas flores,

nos galhos desabrochando,

trazem notícias em cores

da primavera chegando...

 

Colombo aos mares se fez

sem que o perigo o assustasse...

e, graças ao genovês,

ganhou, o mundo, outra face!

 

Sobre seda ou algodão,

na trama dos figurinos,

o Supremo Tecelão

faz desiguais os destinos.

 

O flerte, as voltas na praça,

o tempo levou embora

e o amor foi perdendo a graça

sem o respeito de outrora...

 

Crepita a floresta... e os ninhos

vão de roldão na queimada.

Que vai ser dos passarinhos

que não têm culpa de nada?

 

Que o amor faz sofrer... sabia...

mas, mesmo assim, eu te amei

e, agora, a sabedoria

vive a dizer: - Não falei?...

 

Morrem florestas, açudes,

e o mundo, pobre de afeto,

perde os versos e as virtudes:

- vira selva de concreto!

 

Passei a viver tristonho

depois que encontrei, surpreso,

o limite do meu sonho

no muro do teu desprezo!

 

Em fortuna, eu tenho sido

qual uma agulha modesta

que borda um belo vestido

e a linha é quem vai à festa!

 

Parto... não levo saudade...

as desavenças são tais,

que a minha e a tua verdade

já são mentiras iguais.

 

Ele partia e, na pressa,

prometeu que voltaria.

Hoje eu sei, não foi promessa.

Na verdade... ele mentia...

 

Falo de tuas ausências

à garoa, que não passa

e ela deixa reticências

sobre o frio da vidraça.

 

Esta fé que me incentiva,

e em minha vida se espalma,

é uma luzinha votiva

na capela de minha alma!

 

Pessoas que, na ilusão,

cantam virtudes sem tê-las,

são como as poças do chão

que pensam conter estrelas.

 

Tu chegavas... e eu ouvia

o trem, em tons comoventes,

tocar canções de alegria

no teclado dos dormentes...

 

Na tarde cálida e mansa,

o tempo quase não passa

e até o silêncio descansa

nos velhos bancos da praça.

 

A teu lado, mas... sozinho...

quantas noites, quantos dias

eu transbordei de carinho

mas te achei de mãos vazias...

 

A ciranda traz lembranças,

que a saudade perpetua,

de um tempo em que nós, crianças,

éramos todas de rua...

 

Blasfemar... sei que é errado

mas, Te pergunto, Senhor:

se o amor que eu sinto é pecado,

por que me deste este amor?...

 

Bondes... quintais... lampiões...

Nesta saudade eu me abrigo

aconchegando ilusões

que envelheceram comigo...

 

Quebra o trenzinho... eu conserto

e sinto, ao vê-lo nos trilhos,

a minha infância mais perto

quando eu brinco com meus filhos.

 

O cheiro de flor que invade

a varanda, onde eu me abrigo,

engana a minha saudade

e eu penso que estás comigo.

 

Ousei te amar sem medida,

sem cautela, sem pudor...

e hoje pago, arrependida,

por esse instante de amor...

 

Trago um porongo em meu peito

onde a saudade, contida,

é um chimarrão que tem feito

o amargor de minha vida...

 

Vou, na insônia de meus passos,

esquecer, na boemia,

que um felizardo, em teus braços,

dorme o sono que eu queria...

 

Sem muros, as casas pobres

trocam favores, carinhos...

enquanto que em ruas nobres

ninguém conhece os vizinhos.

 

O que mais feriu minha alma,

relendo os bilhetes teus,

foi ver a grafia calma

com que me escreveste “Adeus”!

 

Dos naufrágios, dos degredos,

restaram, dentro do mar,

ecos de velhos segredos

que as conchas sabem guardar...

 

Quis te falar... mas não pude...

Então te dei uma flor.

As flores têm a virtude

de saber falar de amor...

 

Canta, Poeta!  O teu canto,

de um sentimento profundo,

é o turíbulo de encanto

que vai incensar o mundo!

 

“Terra à vista”! e, em praias calmas,

foi ancorando Cabral.

E o destino bateu palmas

nos unindo a Portugal!

 

Tão suave é o teu carinho

que eu penso, quando te enlaço,

que o meu corpo é um passarinho

que fez ninho em teu regaço...

 

Primeiro amor... é a ternura

que a nossa memória enfeita.

É como a fruta madura

de uma primeira colheita...

 

A noite desfez em contas

seu rosário de cristal

e enfeitou todas as pontas

da grama do meu quintal!

 

O Ano Novo se avizinha

e eu, de tristezas cansado,

compro uma nova folhinha

e rasgo o tempo passado.

 

Da cruz, do açoite, do espinho,

de um sofrimento profundo

veio o sangue que, sozinho,

lavou as culpas do mundo!

 

Amena e doce ebriedade,

que a adega do tempo apura,

o amor, na terceira idade,

é um vinho de uva madura!

 

Ante um berço, comovida,

e no adeus dos cemitérios,

fui aprendendo que a vida

é ponte entre dois mistérios.

 

O coração nunca esquece

as mágoas de uma traição...

Quem trai, no amor, não merece

a largueza do perdão!

 

A tua ofensa me assusta

e, desta vez, digo “não”!

Quem ama sabe  o que custa

ter que negar o perdão!

 

Num foguetório cerrado,

o céu junino reluz

qual um chuveiro dourado

pingando gotas de luz!

 

Tímida, não disse nada,

mas o sorriso que deu

foi a mensagem cifrada

que o meu amor entendeu...

 

No leito, o rio desliza

numa preguiça de sexta-feira
e, em silêncio, fertiliza

os meandros da floresta!

 

Na insônia da solidão,

eu só sei que o tempo passa

porque escuto um carrilhão

dando as horas, lá na praça!

 

Esta flor que me restou

num livro da mocidade

é um sonho que se tornou

medalha de uma saudade!

 

Enfim voltaste... mas peço

que este clima de alegria

envolvendo o teu regresso

não dure só por um dia...

 

Homem bom de rosto feio!

Tua aparência enganosa

lembra a pedra cujo seio

guarda uma gema preciosa!

 

Se alegres, vão repicando;

se tristes, plangem com calma...

E eu fico, às vezes, pensando

que os sinos também têm alma!

 

Nosso amor hoje e passado

e, apesar de breve história,

persiste, ainda, ancorado

no cais de minha memória.

 

Teu desprezo me magoa.

Não me queres, não te forço.

Mas, o que mais me atordoa

é não sentires remorso...

 

Foi num mar encapelado

que o meu barco de ideais

naufragou de tão pesado:

- tinha esperanças demais!

 

Partias... mas era tarde

para eu tentar te deter...

E nessa omissão covarde

te perdi... sem combater...

 

Sigo em frente em meus trabalhos,

porém não sigo sozinho.

Com Deus, que aponta os atalhos,

encurto muito caminho.

 

Brinquedos velhos, em trapos,

sem importância parecem,

mas guardam, nos seus farrapos,

lembranças que não se esquecem.

 

Tem pena de minha dor!

Por favor, usa a franqueza!

Pois as dúvidas, no amor,

maltratam mais que a certeza!

 

Teu amor... quase acabado...

Mas, tentando me iludir,

sigo sofrendo a teu lado

sem coragem de partir...
 

Eu nunca amarei um poeta

mesmo que ele me seduza

pois seu verso, de alma inquieta,

vagueia, de Musa em Musa!...

 

Impiedoso, o fogo avança

e a floresta, calcinada,

perde o verde da esperança;

ganha o cinza do mais nada!

 

Poeta! Colhe o teu canto

peneirando sobre as lavras,

pois há pepitas de encanto

no garimpo das palavras!

 

Das saudades e lembranças

do amor, que foi verdadeiro,

restou um par de alianças

na mão de um só companheiro.

 

No abandono, em desalinho,

eu sonho me embriagar

na branca taça de vinho

que se derrama em luar...

 

Com a emoção renascida

no amor, que só veio agora,

o ocaso de minha vida

ganhou matizes de aurora...

 

A Primavera passou...

mas passou tão distraída,

que nem sequer se lembrou

de reflorir minha vida...

 

Com meu orgulho pisado

mas, de saudades vencida,

dou-te o perdão e a teu lado

esqueço as mágoas da vida.

 

Por florescer altaneira

na paisagem descampada,

aquela velha paineira

tornou-se um marco de estrada!

 

Se, à noite, a lua promete

sonhos de amor... tem cautela!

O luar que ela reflete

é luz do sol... nem é dela!

 

Partiste... e a tarde silente,

daquele dia tristonho,

vestiu de roxo o poente

no funeral do meu sonho...

 

Quando a ingênua ressonância

de um realejo me invade,

eu sinto emoções da infância

dançando em minha saudade!

 

O destino se disfarça...

Veste risos e tristezas

e apresenta, em cada farsa,

incalculáveis surpresas...

 

O homem pobre, passo a passo,

ergue a cidade cinzenta

tirando da pedra e do aço

a quimera que o sustenta!

 

Na Quaresma, a natureza,

com flores de manacás,

tece um manto e, com tristeza,

veste as serras de lilás...

 

Sem aliança no dedo,

sem altar, sem certidão,

quanto amor vive em segredo

com laços no coração!

 

Em minha família, unida,

todos sempre me apoiaram

e em troca eu busco na vida

ser a filha que sonharam...

 
ÚLTIMAS TROVAS PREMIADAS DE MARINA, DOIS MESES ANTES DE SUA PARTIDA. POR IRONIA, O TEMA ERA "DESPEDIDA":

Após a tua partida
eu vejo o espaço em metades:     (5º lugar UBT SP, outubro/2013)
do teu lado, a despedida:
do meu lado... só saudades...
 

Levaste, na despedida,
os meus sonhos nos teus passos     (11º lugar no mesmo concurso)
e desde então, dividida,
tenho o meu sono em pedaços...

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TROVAS DE BOM HUMOR
 

“Cachorro!”, gritou o pato             (co-vencedora em São Paulo - 1992)
numa atitude insensata,
quando ouviu dizer que o gato
estava lambendo a pata!

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NOTA = quase todas as trovas foram extraídas de seu livro "Cantares", lançado em 2010 pela "Ar-Wak  gráficas ltda"