I Jogos Florais de Niterói - 1964

        I JOGOS FLORAIS DE NITERÓI - 1964
                       TEMA:  "MAR"

(entre as mais de quatro mil trovas enviadas, foram selecionadas cem: 13 por ordem de classificação e, as demais 87, em ordem alfabética)

Passou... bonita de fato!
E o mar, ao vê-la tão bela,
sentiu não ser um regato
para correr atrás dela...
1º lugar: ORLANDO BRITO - SP

O mar nos deu a receita
de um viver sábio e profundo:
sendo salgado, ele aceita
as águas doces do mundo!
2º lugar: LUIZ OTÁVIO - Guanabara

Do Tejo partiu a armada
de Pedro Álvares Cabral
e fez no mar uma estrada
do Brasil a Portugal.
3º lugar: CELSO FURTADO DE MENDONÇA - Niterói

Ó velho mar, são singelas
as tuas fúrias insanas,
comparadas às procelas
do mar das paixões humanas!...
4º lugar: APARÍCIO FERNANDES - Guanabara

Traduzes, mar, na ansiedade,
e no apelo dos teus ais,
todo amargor da saudade
que os barcos deixam no cais...
5º lugar: ORLANDO BRITO

Ao raiar da madrugada
eu vi o sol desenhar
uma lagoa dourada
na superfície do mar.
6º lugar: LUIZ OTÁVIO

Em paradoxos te esmeras,
mar, que crias, que destróis!
Verde berço de quimeras...
negro túmulo de heróis!
7º lugar: VILMAR DE ABREU LASSANCE - Niterói

No meu peito, tatuados,
dois corações a sangrar.
Neles, três temas lembrados:
a mulher, o porto e o mar.
8º lugar: FRANCISCO MANOEL BRANDÃO - Niterói

O mar imenso e profundo
vai gemendo, sem parar...
Todo gemido do mundo
geme no fundo do mar!...
9º lugar: COLBERT RANGEL COELHO - Guanabara

Por mais que o mar se lamente,
o seu choro não deploro:
- O mar chora, mas não sente,
eu, por sentir, é que choro!
10º lugar: JOSÉ MARIA MACHADO DE ARAÚJO - Guanabara

Caminho de caravela
nas descobertas antigas,
hoje o mar é passarela
ligando as nações amigas.
11º lugar: RENATO VIEIRA DA SILVA

Dorme o mar pesado sono.
Enquanto isso a Lua-cheia,
cansada deandar sem dono,
deita comigo na areia.
12º lugar: PAULO EMÍLIO PINTO - Minas Gerais

No casco do meu veleiro
escrevi esta verdade:
coração de marinheiro
só do mar sente saudade.
13º lugar: ORLANDO BRITO
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(seguem-se 87 trovas, em ordem alfabética)

Quando a terra em seu girar
o dia em trevas reduz,
a lua emerge do mar,
pingando gotas de luz!
ANNIBAL VITRAL MONTEIRO -  Guanabara

Barqueiro dos mil pesares,
acostumado entre escolhos,
tenho a tristeza dos mares
na tristeza dos meus olhos.
ANTONIETA BORGES ALVES - SP

Eu, que sempre fui descrente,
chego, às vezes, a pensar
que é Deus o eterno regente
da sinfonia do Mar!

Eu penso que nem o mar,
revolto, imenso e profundo,
conseguiria lavar
toda miséria do mundo!
APARÍCIO FERNANDES - GB   (duas trovas)

Lembra o mar a mão incerta,
que oferece e quer negar:
avança fazendo oferta,
recua para não dar!

Com o que nos sobra ou nos falta,
vive o amor em nosso lar...
- Maré baixa, maré alta,
assim também vive o mar!
ARCHIMINO LAPAGESSE -  Guanabara   (duas trovas)

Penso, ao ver a Guanabara,
largo azul que o mar constrói:
- esse mar não nos separa,
une o Rio a Niterói.

Rendeiras de toda parte,
tecelãs de fina teia,
vinde à praia ver com que arte
o mar faz rendas na areia.
CARLOS GUIMARÃES -  Guanabara   (duas trovas)

Que vagas agalopadas!
Que graça, que movimento!
Parecem potros bravios
com crinas de espuma ao vento!
CELSO FURTADO DE MENDONÇA

Vendo o Progresso furtar
cotas do mar, em excesso,
tomei partido do mar,
no meu repúdio ao Progresso.

O mar, em triste agonia,
vive sempre a soluçar...
Na minha vida vazia,
há muita coisa do mar.

Barco perdido entre escolhos,
posso, agora, desvendar,
nos mistérios dos teus olhos,
todo o mistério do mar.
COLBERT RANGEL COELHO   (três trovas) 

Mar convulso, mar sereno,
mar de mistério e beleza!
Como me sinto pequeno
em face à tua grandeza!
DE AZEVEDO ROLIM - Estado do Rio

No mastro ao longe oscilando,
a vela branca, a passar,
parece um lírio boiando
na superfície do mar.
DOLORES ALMEIDA -  Guanabara

Nas incertezas do mar
a velha jangada avança
e a esperança de voltar
fica, às vezes, na esperança.

Olho o mar, de Icaraí,
à hora em que o sol se deita,
e me convenço que, ali,
a mão de Deus foi perfeita.
DURVAL MENDONÇA -  Guanabara   (duas trovas)

Caracóis, conchas redondas,
que o mar guarda, com desvelo,
são roubados, como as ondas,
das ondas do teu cabelo...

As ondas do mar, que vão,
as ondas do mar, que vêm,
parecem meu coração:
- Batem... Batem... Sem ninguém...
EDGARD BARCELLOS CERQUEIRA -  Guanabara   (duas trovas)

Sou o dono da paisagem,
possuo o mar e uns anzóis...
Um dia, amor, a miragem
vai trazer peixe pra nós.

Beija as areias do mundo
o mar, com as rendas de um véu:
volúpia que vem do fundo
ou amor que vem do céu?
EDUARDO LUIZ GOMES FILHO - Niterói   (duas trovas)

Que o mundo melhor se faça,
ante o símbolo profundo,
do mar que, eterno, entrelaça
os mil caminhos do mundo.
FERNANDO BURLAMAQUI - Pernambuco

O mar, que é poeta, em rondas
de amor pela Lua-cheia,
escreve versos com as ondas
no livro branco da areia.
GERALDA FERREIRA DE A. MARQUES - Minas Gerais

Mar, mistério, poesia...
Se te pudesse cantar,
quantas coisas eu diria
nestas trovas a rimar...
HESIODO DE CASTRO ALVES - Niterói

Velas brancas se afastando,
jangadas, ao sol nascente,
parecem cisnes boiando
num lago fosforescente.

No fim da esteira dourada
que, no mar, tece o arrebol,
o barco, de madrugada,
é um ponto negro no sol!

O jangadeiro, enfrentando
o rubro mar do poente,
lembra um Deus desafiando
um dilúvio incandescente...
IRACI DO NASCIMENTO E SILVA -  Guanabara   (três trovas)

Fui Ulysses, naveguei
sem temer tufão e escolhos,
mas, ao te ver, naufraguei
no verde mar dos teus olhos!
ISIMBARDO PEIXOTO - Niterói

Nós dois... Soprava o terral:
o nosso barco afastou-se...
Nunca, num leito de sal,
a vida me foi mais doce!

Muros, cercas... Pela terra
o homem vive a brigar.
Por isso, sem fazer guerra,
eu tomei conta do mar.
JACY PACHECO - Niterói    (duas trovas)

A vida é mar inclemente,
amargo, cheio de mágoas,
que põe nos olhos da gente
o gosto das suas águas.
JOÃO RANGEL COELHO -  Guanabara

Eu conheci a tristeza
ao ver, nas praias do norte,
o mar a uns dar riqueza
e dar a outros a morte!

Ó mar, que inspiras poesia,
só invejei tua cor
até conhecer, um dia,
os olhos do meu amor!

Homens, olhai para o mar,
olhai com olhos de ver
e já podeis calcular
como é que Deus há-de-ser!...

Ondas do mar, fragorosas,
na minha angústia incontida,
acho bem mais perigosas
as ondas do mar da vida!

Olho o mar... As ondas crescem,
crescem, tombando em seguida.
As ondas do mar parecem
um vivo espelho da vida!...

Sobre a terra seca, um dia,
Deus o homem concebeu.
Mas ao ver-lhe a alma fria,
Deus chorou... e o mar nasceu.

Que sentido desigual
nesta vida as ondas têm:
- As nossas, fazendo o mal,
- as do mar, fazendo o bem...

Noutros tempos, mar sombrio,
tive dias tão risonhos,
que se estivesses vazio
podia encher-te de sonhos!...

Meu destino é navegar,
e sou feliz nessa lida:
- Antes perder-me no mar,
do que perder-me na vida!

Fui à praia, onde brinquei
tantas vezes, no passado...
Ao regressar, reparei
que o mar ficou mais salgado!...

Quando vou veranear
na praia, de brotos cheia,
não vejo as ondas do mar
com tantas ondas na areia...

A verdade nunca escondas,
planta, na vida, só o Bem.
O mar, que faz tantas ondas,
não faz onda com ninguém!

Cruzei o mar ao teu lado
como se minha tu fosses.
- Agora, do mar salgado,
só tenho lembranças doces.

Se o mundo encheste de glória,
por quem é que choras, mar?
- Tu és um herói na história
e é feio um herói chorar!
JOSÉ MARIA MACHADO DE ARAÚJO   (catorze trovas)

Meus versos - estro de monge -
querem ser luz de luar
e rios que vêm de longe
na trova que faço ao mar.
JOSÉ VALERIANO RODRIGUES - Minas Gerais

Mar, por astúcias do Mal,
manchaste o Brasil inteiro!
Devias trazer Cabral,
nunca o Navio Negreiro!

Tesouros guarda, avarento,
o mar de vagas inquietas.
Os meus, com vaidade, ostento!
- Mostro ao mundo minhas netas.
LILINHA FERNANDES - Guanabara   (duas trovas)

Como Colombo, singrando
esta vida - incerto mar,
vivo no mundo esperando
um Novo Mundo encontrar...

Luta sempre e desde cedo,
sem nunca desanimar,
pois o mais duro rochedo
cede à constância do mar...

No céu, a lua a escutar
a noite de serenata,
beijando as ondas do mar
faz surgir rolos de prata...

Uma das mais belas cenas
eu lamento não ter visto:
as ondas do mar, serenas,
ao sentir os pés de Cristo...

Mar inconstante e profundo,
de tristezas e alegrias!
- É berço para Raymundo
e mata a Gonçalves Dias...

Na beira do cais, serenos,
os barquinhos, ao luar,
são como berços pequenos
embalados pelo mar...

Retrato de tua sorte
podes nisto contemplar:
todo rio, por mais forte,
encontra a morte no mar...

Lá no horizonte o barquinho,
mansamente, a velejar,
parece que de mansinho
sobe o céu... e deixa o mar...
LUIZ OTÁVIO   (oito trovas)

As tristezas que te sobram,
crê que as podes suportar...
As águas que o céu transborda
cabem todinhas no mar.

Mar profundo, as tuas vagas,
de onde vêm, para onde vão?
O que buscam noutras plagas?
Uma distante afeição?
MANITA - Niterói   (duas trovas)

Enfrenta o mundo, sem medo -
mas à ofensa não respondas:
morre de encontro ao rochedo
a fúria insana das ondas!...
MARIA DE LOURDES LORETTI MOTTA -  Guanabara

Manadas de potros brancos
galopam por sobre o mar,
as crinas batem nos flancos
na fúria de galopar!

As caravelas do sonho
navegam dentro de mim,
- querendo um porto risonho,
- lutando num mar sem fim...
NILZA CASTRO - Rio Grande do Sul   (duas trovas)

O mar, gigante, sereno,
tem a força das marés;
e eu, sendo assim tão pequeno,
o tenho sempre a meus pés.

Vai Anchieta escrevendo
poemas na areia fria...
O mar os vai recolhendo
e os leva à Virgem Maria.
NYDIA IAGGI MARTINS - Nova Friburgo   (duas trovas)

Dos heróis seguindo a rota,
no mar profundo e cruel,
já comandei uma frota
de barquinhos de papel...

Vendo o mar unir as terras,
povos, crenças, par a par,
os rios, descendo as serras,
vão cantando para o mar...

No ardor das mesmas porfias
nós rolamos, mar profundo,
tu - contra as rochas bravias,
eu - contra as pedras o mundo!

No meu peito um búzio existe
que as queixas do mar encerra,
quando ecoa, imenso e triste,
nas praias de minha terra...

Velho e errante caramujo,
à lua ou ao sol em brasa,
pelo mar vive o marujo
carregando a sua casa...

Quando ao vento abrindo as velas,
cruzo, ó Mãe, o mar traiçoeiro,
teu olhar, entre as estrelas,
vai seguindo o meu veleiro...

Marinheiro eu já crescia
na pobreza do meu lar.
- Sal do pranto me fazia
tomar gosto ao sal do mar.

Na manhã clara e bonita
sopra o vento, e em suas rondas
põe laços brancos de fita
na cabeleira das ondas...

Ao regato pequenino
diz, chorando, o velho mar:
- Quem me dera o teu destino,
sempre a correr e a cantar...
ORLANDO BRITO   (nove trovas)

Ah! Como é doce escutar,
quando a luz no céu desmaia,
o canto triste do mar,
ninando a areia da praia!

Enquanto o mar lambe a areia
com volúpia, devagar,
de ciúmes a Lua-cheia
chora prantos de luar.

Na rede argêntea do luar
balança o mar sonolento...
E eu a vogar, a vogar,
no barco do pensamento...
PAULO EMÍLIO PINTO - Minas Gerais   (três trovas)

Sou triste como este mar,
que, num lamento profundo,
parece até represar
todas as mágoas do mundo.
P. DE PETRUS -  Guanabara

Bosquejo a paisagem. Traço,
na manhã que desabrocha,
gaivotas singrando o espaço,
e o mar açoitando a rocha...
PEDRO UZZO - SP

No mar revolto do mundo
minha vida andou ao léu...
Se o barco não foi ao fundo,
foi por milagre do Céu!

Meu barco da fantasia
naufragou no mar da vida,
pois a carga que trazia
ultrapassava a medida...

A vida é frágil veleiro
singrando mares bravios
e, por isso, o seu roteiro
sofre constantes desvios.
RENATO VIEIRA DA SILVA    (três trovas)

O mar tem alma... Costuma,
em noites de Lua-cheia,
cobrir de rendas de espuma
seus alvos leitos de areia...
VASCO DE CASTRO LIMA -  Guanabara

Duas coisas há no mundo,
de grandeza incomparável:
o amor - mistério profundo,
e o mar - abismo insondável.
VERA MILWARD DE CARVALHO - Minas Gerais

Ó mar, eu te adoro e temo,
porque és belo, falso e cruel,
pois, mesmo em fúrias de um demo,
tu refletes, sempre, o céu!
VILMAR DE ABREU LASSANCE

No mar do amor, quando avista
das gaivotas os sinais,
meu peito diz: "terra à vista!"
mas nunca divisa o cais
WALTER GOMES DA SILVA - Estado do Rio

Meu sonho se perpetua
renascendo, sem cessar,
como a espuma que flutua
nas ondas verdes do mar.

Barquinho de vela erguida,
do mar profundo ao sabor.
- eis como avança, na vida,
um coração sonhador.
WALTER WAENY JUNIOR - Santos   (duas trovas)

Mar em fúria, mar em jade,
mar tranquilo, mar de altar.
- Como a calma e a tempestade
são efêmeras no mar!

Minha alma - branca jandaia -
que não tem onde pousar,
é como as aves da praia
que morrem sempre no mar.
ZALKIND PIATIGORSKY -  Guanabara    (duas trovas)

NOTA = esse material foi uma gentil contribuição da trovadora DIVENEI BOSELI, da UBT São Paulo/SP