Zaé Jr. - Botucatu/SP

ZAÉ MARIANO CARVALHO DO NASCIMENTO JUNIOR  nasceu em Botucatu, interior de São Paulo, no dia 08 de junho de 1929. Reside na capital paulista. Dono da "Promark Propaganda e Marketing", homem de jornal, rádio, TV e cinema, possui um currículo riquíssimo. Roteirista da novela "A Deusa Vencida". "O Homem e seu Quintal" é um de seus livros. Como trovador... bem, como trovador, suas trovas podem melhor defini-lo. Veja mais deste grande poeta no link a seguir:   http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_4690.html
          
          Zaé Junior faleceu em São Paulo no dia 20 de agosto de 2020, depois de longo período lutando principalmente contra o Mal de Alzheimer.

 

 

1001 TROVAS - DE ZAÉ JÚNIOR   (por enquanto, 500)
 
001
Entre as flores, volto ao beco
do sobrado em que moraste,                                              (2o. lugar Friburgo-1998)
na janela, um vaso seco
é o sinal ... que não voltaste.
002
Volta o filho... anos incertos!
E a mãe, que apenas sorriu,
já tinha os braços abertos,
desde quando ele partiu!
003
O nosso amor vem de quando
Deus criou o amanhecer...
E ainda estarei te amando,
quando Deus envelhecer...
004
Para a chuva... e no horizonte,
luzindo ao sol na distância,
o arco-íris é a minha ponte,
por onde eu retorno à infância!
005
Velha viola, na orfandade,
calou-se, pois seus segredos
não suportam a saudade
nem o toque de outros dedos!
006
Se a lua é minha alma gêmea,
longe de ti eu bendigo
esta saudade boêmia,
que passa as noites comigo!
007
Se o teu nome é Rosa, és rosa                                           (SP 1998)
que as rosas não podem ser,
rosa tu colhes... E airosa,
nunca te deixas colher!...
008
Ó musa, se eu te perdi
por caminhos tão dispersos,
junto os pedaços de ti
espalhados nos meus versos!
009
Faço a ronda da saudade,
e na praça, um velho bonde
traz de volta a mocidade,
que ele deixou... não sei onde!
010
Partiste e no Adeus... risonho,
teu bilhete sem carinho,                 (Menção Especial-Friburgo-1999)
provou- me que o nosso sonho
eu sonhei... sempre sozinho!
011
Quando a lágrima do olhar
beijar o sol num Adeus,
um arco-íris vai brilhar
entre os meus olhos e os teus!
012
Qual cego inventando os dias,
mas com Deus lhe dando os tons,
Beethoven fez de harmonias
seu universo sem sons!
013
Há quem aceite e quem negue,
mas o mistério persiste:
por que o ateu não consegue
provar que Deus não existe?
014
Se tu buscas na partida
além do horizonte, a paz,
não fujas da própria vida,
que a vida sabe o que faz!
015
Brancas, rubras, amarelas,
de rosas colho um balaio!
Mas te ofereço as mais belas,
as rosas rosas de maio!
016
Meu sábio pai, sem cultura,
me ensinando o que sabia,
me ensinou que a lida dura
também traz sabedoria!
017
O bonde rangeu nos trilhos,
meu pai desceu, não sei onde...
Seguimos, a mãe e os filhos,
sozinhos no mesmo bonde!
018
Quando a saudade é saudade,
saudade que faz penar,
saudade é felicidade
que se foi e quer voltar!
019
Ao cumprir o meu dever
de filho, de pai, de irmão,
aprendi que compreender
vale mais que ter razão!
020
Depois do amor sem censura,
nossos agrados sutis,
dizem coisas de ternura
que a nossa boca não diz!
021
Há quem renove a esperança
e com promessas se iluda...
mas o Ano Novo é mudança,
que em verdade nada muda!
022
Na Academia onde moram,
em sussurrante coral,
os imortais também choram
a morte de um imortal!
023
O chão não é de ninguém
nem do seu "dono", um instante;
do chão os homens só têm
sete palmos... e é o bastante!
024
Vovó, desfiando o rosário
das peraltices que fez,
foi zerando o calendário,
virou criança outra vez!
025
No princípio, a solidão,
mas tu voltaste... e depois,
não coube em meu coração,
o que restou de nós dois!
026
Não queiras cobrar com sangue
o mal que te machucou,
pois o mal é um bumerangue
que volta à mão que atirou!
027
Meu cirquinho no quintal
era um circo de verdade;
na infância, não tinha igual
nem tem igual na saudade!
028
Na infância a gente brincava,                                     (Venc. Bandeirantes 1996)
eu de sol, você de lua ...
e o universo começava
e acabava em nossa rua!
029
Na existência dividida
pela incompreensão da idade,
se não te encontrei em vida,
te encontro, pai, na saudade!
030
Meu reino é um casebre antigo
onde um sol, sem majestade,
vem, de cócoras comigo,
aquecer minha saudade!
031
Meu barraco, sem queixume,
fiz com redes de cipós...
mas a vida, com ciúme,
um a um desfez os nós!
032
Sagrado seja esse chão
no qual rezando, o roceiro
planta o próprio coração,
para a fome do ano inteiro!
033
Herói, que vence o cansaço
da vida em rude batalha,
tem no peito um marcapasso,
sua invisível medalha!
034
Do teu perfil, na verdade,
só podes ver um pedaço,
pois para a tua vaidade,
o espelho tem pouco espaço!
035
Na penumbra, sobre a toalha,
vultos que a vela produz
mostram que a sombra não falha,
por menor que seja a luz!
036
Quando a seresta termina
sob o lampião do jardim,
a solidão, em surdina,
toca apenas para mim!
037
Meu pai, a tua bondade,
que nos deu pão na pobreza,
é agora a farta saudade
que se serve em nossa mesa!
038
E quando o inverno chegar,
saudosos, em seus desvelos,
meus dedos irão esquiar
na neve dos teus cabelos!
039
Em silêncio vejo pura,
disfarçada em teu olhar,
a lágrima de ternura
que não querias chorar!
040
A ternura que deixaste,
pai, qual herança tão nobre,
deixou-me na alma o contraste
de ser rico... sendo pobre!
041
Em frente à perfumaria,
enquanto o ônibus espera,
pergunta o cego ao seu guia:
- Já chegou a primavera?
042
Manhã... a geada caindo...
Mas se do inverno estou farto,
beijo os teus olhos se abrindo
e é primavera em meu quarto!
043
Teu olhar azul celeste
só sabia dizer não;
tantos não azuis disseste,
que azul virou poluição!
044
No meu palco de ilusão,
quando se fecha a cortina,
ao terminar a sessão,
a ilusão nunca termina!
045
Com pena das minhas penas,
tais penas o assum levou,
e apenas penas pequenas
das próprias penas deixou!
046
Cansado, mas com coragem
de continuar a jornada,
a vida é a minha bagagem,
que vou deixando na estrada!
047
O meu sonho é um passarinho,
que de voar ficou farto
e acabou fazendo o ninho
na janela do meu quarto!
048Ouço a melodia amena,
que vem do cosmos disperso
e minha alma, tão pequena,
ganha amplidão de universo!
049
Sem fronteiras, num só laço,
os homens são mais felizes,
pois a Terra, lá do espaço,
não se divide em países!
050
O tempo é como a caverna,
que não tem volta nem fundo,
onde a vida, que é eterna,
dura apenas um segundo!
051
Quem perde o tempo não sabe
que perde a vida também,
pois jamais a vida cabe
no tempo que a gente tem!
052
Não me agrada a falsa glória
que o jogo da vida tem,
pois sei que toda vitória
sempre é derrota de alguém!
053
Depois da chuva inclemente,
levando um pássaro morto,
o ninho, na água corrente,
é nau fantasma e sem porto!
054
Queres ferir-me gritando,
mas em soluços aflitos,
os teus murmúrios chorando
me ferem mais que teus gritos!
055
O poeta mais que o soldado,
se quiser ser vencedor,
terá que amar, ser amado,
e só perder por amor!
056
O atalho me leva à ermida,
a ermida me leva a Deus;
e Deus me leva à outra vida,
que a levou dos olhos meus!
057
Sem abrigo, ao vento forte,
sem jardim e sem escolha,
sou frágil trevo sem sorte
à espera da quarta folha!
058
Se descobrir é preciso,
mais preciso é navegar;
"Terra à vista"... e um paraíso
floresceu além do mar!
059
Brilhando ao sol, em cascata,
as águas, fazendo festa,
jorram confetes de prata
no carnaval da floresta!
060
Lembra? Eu brincava de Rei,
você... de escrava brincava;
do meu sonho hoje acordei,
escravo de minha escrava!
061
Seu regresso foi surpresa,
pois já ninguém o esperava;
nem sentou... tinha outro à mesa,
na cadeira em que sentava!
062
Fiz da vida um labirinto,
do qual, se eu tento escapar,
quanto mais fujo, mais sinto
que estou no mesmo lugar!
063
Sem família, na orfandade,
aprendi triste lição;
quanto mais dói a saudade,
menos dói a solidão!
064
Meu pai, a tua bondade,
que fez da família um lar,
hoje abençoa a saudade
que ficou em teu lugar!
065
Dividindo, sem paixão,
tudo o que nos pertenceu,
levaste o teu coração,
mas não me deixaste o meu!
066
Copiando os astros distantes,
o sereno, em seus desvelos,
pousa estrelas de diamantes
na noite ds teus cabelos!
067
Plantando a vida se cansa...
e o caboclo, sem espaço,
colhe tão pouca esperança,
que não vale o seu cansaço!
068
A cadeira de balanço
balançou toda a família...
meu avô, no sono manso,
meu neto, em louca vigília!
069
Se esse teu brilho me cega,
me condena à escuridão,
saibas que a luz não renega
a sombra que faz no chão!
070
Quando a solidão me invade,
distante do teu carinho,
eu me agarro na saudade
para não chorar sozinho!
071
Tu nasceste nesta rua,
eu nasci além dos mares,
mas foi sempre a mesma lua
que juntou nossos olhares!
072
Ouço ainda na distância
mamãe ao piano da sala...
pois a música da infância
nem na saudade se cala!
073
Passei a vida cantando
minhas canções que eram dela...
e a ingrata, mesmo escutando,
nunca me abriu a janela!
074
A esperança do colono
de sol a sol é cativa...
mas seu patrão não é dono
dos sonhos que ele cultiva!
075
Tu a Rainha... eu o Rei,
nossa infância, que alegria!
Era um reinado sem Lei
nossa ingênua Monarquia!
076
Nosso encontro, que delírio,
traz carícias a nós dois...
pena que venha o martírio
da despedida... depois!
077
A vida é luz refletida
nos seus olhos... e eis por que
prefiro o flerte da vida,
que o infinito sem você!
078
Se antigo não se renova,
a saudade que me diga:
existe coisa mais nova
que minha saudade antiga?
079
Caminheiro de olhos baços,
em busca dos teus carinhos,
para que servem meus passos,
se me apagaste os caminhos?
080
Velho em plena mocidade,
sem alma, sem ideais,
que faço desta saudade,
se nem ela me quer mais?
081
Se a morte não me intimida
e as tristezas não endosso,
eu só quero, havendo vida,
ser eterno enquanto posso!
082
O espelho não me enganou,
sem disfarce, esse sou eu:
um jovem que não sonhou,
um velho que não viveu!
083
Nem sempre o pranto é aflição,
pois a mãe, que a Deus implora,
ao rever seu filho são,
de alegria também chora!
084
Carreteiro em disparada,
transporto a carga suicida;
se atrás é mais longa a estrada,
na frente é mais curta a vida!
085
No reino dos fariseus,
entre reis sem majestade,
o mais pobre, entre os hebreus,
é que foi Rei de verdade!
086
Melhor sorrir na pobreza                           (co-vencedora UBT SP - 1991)
que ser rico na apatia,
pois fartura sobre a mesa
não enche a vida vazia!
087
Prendes a voz do meu canto,
minhas queixas, meu querer,
mas as gotas do meu pranto
tu não consegues prender!
088
Foi de horas mortas, furtivas,
este amor que agora cortas...
mas, em mim, como estão vivas
essas nossas horas mortas!
089
O meu sonho é uma tapera
que nenhum caminho corta;
e assim mesmo ainda espera
que alguém bata à sua porta!
090
Quando perto, era a fragrância
de um amor contido e estranho,
até que veio a distância
mostrar todo o seu tamanho!
091
Com passagem só de ida
no meu barco sideral,
sou marinheiro da vida
chegando ao porto final!
092
O amor-perfeito é uma flor
que podes colher sem mim;
porém, um perfeito amor,
só colhes no meu jardim!
093
Nas trevas desta paixão,
me carregas, te carrego,
um cego sem direção
sendo guia de outro cego!
094
Desperta a minha cidade,
a praça, o sonho, os pardais...
que saudade da saudade
que agora não sinto mais!
095
O sol fura a telha vã
e em dança que me seduz,
faz no chão, toda manhã,
um baile de sombra e luz!
096
Não me concedeste a dança
que esperei com ansiedade;
mas guardo ainda a esperança
dançando em minha saudade!
097
Não chores, mãe, os pinheiros
que o pai cortou com afeto,
pois são agora os madeiros
que sustentam nosso teto!
098
Se a viola a vida encanta,
mesmo triste estou contente;
meu coração é que canta,
minha viola é que sente!
099
Das estações, a mais triste,
a que mais me causa dor,
é a primavera que existe
num coração já sem flor!
100
Se o nosso amor não importa,
não machuque mais nós dois;
não feche mais uma porta
que não possa abrir depois!
101
Solto do ramo florido,
que o vento açoita, ao revés,
sou mais um cravo abatido
que vai murchar aos teus pés!
102
Mãe, o teu filho aos pedaços,
lembrando as artes que fez,
quer voltar para os teus braços
e ser criança outra vez!
103
Desespero quando espero,
já não quero tantos ais,
e se mais me desespero,
mais espero e sofro mais!
104
Sem querer quebrei o mundo,
que havia em teu coração;
mas, se o remorso dói fundo,
dói mais fundo o teu perdão!
105
Florida, a triste vereda,
por onde um dia eu parti,
é hoje alegre alameda
que já não me leva a ti!
106
De manhã, na branca areia,
meus novos sonhos espalho,
mas à noite, a maré cheia
só me devolve o cascalho!
107
Mãe pobre, as mãos na cintura,
qual uma ânfora de fel,
mostra ao filho a vida dura
de um catador de papel!
108
Esperança companheira
de cada momento meu;
és, hoje, uma simples poeira,
de um sonho que não morreu!
109
O fulgor dos teus brocados
fere tanto o meu olhar,
que mesmo de olhos fechados,
continuo a te enxergar!
110
Depois da vil tempestade,
no arbusto, que ao léu flutua,
a última flor, na orfandade,
diz que a vida... continua!
111
Ao te apartares do amor,
na estrada, após a partida,
não olha a poeira, que é dor,
olha o horizonte, que é vida!
112
Antiga em luz é tua alma
a guiar teu corpo jovem,
como os planetas, em calma,
em torno do sol se movem!
113
Namoro o teu sonho breve,
beijo-te as mãos entre as fronhas
e respiro a brisa leve,
que sopras enquanto sonhas!
14
Planta as flores com encanto,
na vida hostil, já perdida...
e ao regá-las com teu pranto,
colherás de novo a vida!
115
Trocando as cartas na mesa,
a cartomante daninha
também trocou, com certeza,
outra sorte pela minha!
116
Pelos momentos amargos,
que às vezes nos atordoa,
nunca feche os braços largos
para a vida que foi boa!
117
Fazemos amor... depois,
te eternizao em meu abraço;
estátua em paz de nós dois
moldada pelo cansaço!
118
Se me prendes no teu chão
e inclemente me vigias,
meu pensamento, um avião,
faz no céu acrobacias!
119
O meu sonho era de prata,
o sonho teu era de ouro,
não deu liga, virou lata
nosso sonhado tesouro!
120
Foi tão breve essa paixão,
que senti, quando acordei,
a mais pura sensação
de um sonho que não sonhei!
121
No pomar sem zelo e agreste,
na manhã feita de orvalho,
um pobre com frio se veste
com os trapos do espantalho!
122
Minha bandeira é meu grito
no verde, amarelo, azul,
na branca paz do infinito,
que há no Cruzeiro do Sul!
123
Na infância, a minha alegria
não ia além do quintal;
mas cresci... e a fantasia
dança ainda no varal!
124
Nosso amor, falso perfume,
foi demais, trouxe fastio...
pois mesmo em gotas, teu ciúme
deixou o frasco vazio!
125
Faço a barba, levo um talho,
olho no espelho, estremeço;
quem será esse espantalho
que me fere e eu não conheço?
126
Naufragados nos teus olhos,
os meus olhos que eram teus,
as lágrimas são escolhos
dos olhos dizendo Adeus!
127
Coração, antigo cofre,
onde guardei minha vida;
mesmo antigo, ainda sofre,
buscando a chave perdida!
128
Fugindo às paixões da lida,
o homem nunca foge à sorte;
é namorado da vida,
mas só se casa com a morte!
129
Errou nosso Padre Eterno,
guardando o sétimo dia...
porque não previu que o Inferno
nem domingo fecharia!
130
Quanto mais te vejo fria,
mais me queimo em teu olhar;
é que o gelo da apatia
também consegue queimar!
131
O poeta sofre feliz...
faz do verso o seu lamento;
contudo, é sempre aprendiz
do sonho e do sofrimento!
132
Com meus milênios de herança,
me encontro à luz do Evangelho;
sou o aprendiz de criança,
que um dia despertou velho!
133
O homem é tão insensato,
tanto na farsa delira,
que chega a viver, de fato,
o fato que era mentira!
134
- O que é poesia? Perguntas,
com teu sorriso de flor.
- Poesia... é nossas mãos juntas
rezando por nosso amor!
135
A trova é pedra preciosa
lapidada com amor...
quatro pétalas de rosa
formando uma nova flor!
136
Se já não mais lhe pertenço,
não choro nem digo Adeus,
você levou o meu lenço...
e agora os prantos são seus!
137
Teu vulto tem tal fulgor,
teus olhos tamanha luz,
que ao luar do teu amor,
até a sombra me seduz!
138
Se o fulgor faz da alva lua,
no escuro do céu, o altar,
no escuro da minha rua,
teus olhos são meu luar!
139
Lembrança é vida guardada
no coração, aos pedaços,
pegadas na caminhada
sobre a marca de outros passos!
140
Pintei de céu minha rua,
derramei luar de prata,
para que seja só tua
esta minha serenata!
141
Nesta ansiosa caminhada,
em que gastei minha vida,
nunca pensei que a chegada
fosse tão junto à partida!
142
Tanto esperei rejeitado,
que o meu brinquedo, ao chegar,
já o tempo havia passado,
de ser criança e brincar!
143
Só muito tarde, ao voltar,
encontrei o teu bilhete
e a chave do que era um lar
escondida no tapete!
144
Pai, tu partiste e o teu filho,
que embalaste em terno canto,
segue o teu sonho andarilho,
nos caminhos do teu pranto!
145
Pai, se lhe nego a alegria
do filho com quem sonhou,
perdão, não sou quem queria,
sou apenas... quem eu sou!
146
Fiz um castelo a carvão
na calçada da distância,
mas desenhaste um Dragão,
que devorou minha infância!
147
Amor tão doce e sem beira,
de olhos fechados me dás;
pois a boa confeiteira
não prova os doces que faz!
148
Do que te fiz, fiz um laço,
que a minha consciência veste;
só não sei mais o que faço
com tudo o que me fizeste!
149Se todos têm seu brinquedo,
meu brinquedo é a ilusão...
só que não brinco, com medo
qiue se quebre em minha mão!
150
Meu pai, o amor que ensinaste
quando o mundo era o teu lar,
perdeu-se no vil contraste
que esqueceste de ensinar!
151
A vaidade só faz bem
aos pobres de coração,
que acham ter o que não têm,
pensam ser o que não são!
152
Se de amor se faz a vida,
sorva-a bem devagarinho...
uva madura servida
em suaves goles de vinho!
153
Deus criou seres benditos,
mundos mil, feitos de cor...
porém, embora infinitos,
todos menores que o amor!
154
É São João... no meu quintal,
o rosmaninho me dá
saudades de Portugal,
sem nunca eu ter ido lá!...
155
Em junho, na minha aldeia,
tem fogos, luzes sem fim...
mas é a luz de uma candeia
que reluz dentro de mim!
156
Carinho, toque tão leve,
que tão breve se desfaz,
e quanto mais seja breve,
mais prazer ele nos traz!
157
Tu sorris com olhos ternos,
beijo os teus dedos morenos;
como são grandes e eternos
nossos momentos pequenos!
158
Meu barco afundou no rio,
fiquei sem sonho e bagagem;
marinheiro sem navio,
passageiro sem viagem!
159
Sempre que sonho dormindo,
o sonho é curto e bordado;
pois prefiro o sonho infindo,
que sonho quando acordado!
160
Ao despedir-me, pediste,
para bem forte abraçar-te;
te abracei, mas fiquei triste...
como é possível deixar-te?
161
Quando cedo, em doce abrigo,
despertas sem teus cansaços,
a vida acorda contigo
aninhada nos meus braços!
162
Não te dou sambas nem rondas,
nem lembranças de rubis...
mas te dou, para que escondas,
meu jeito de ser feliz!
163
Tudo o que tenho te entrego,
para que guardes por mim;
minha angústia, meu nó cego
e o começo do meu fim!
164
Peço que enterres no outono
meu cadáver no jardim,
para que as flores sem dono
murchem pétalas por mim!
165
Luar, em teu olhar triste
Umedece o meu olhar;
A mor, pena que não viste
R indo na noite o luar!
166
É manhã... e a solidão
que dormiu na minha cama,
é quem apaga o lampião
e bem baixinho me chama!
167
Quando espero e chega o instante,
as coisas nunca dão certo...
por que me sinto distante,
toda a vez que estou tão perto?
168
A galáxia é tão inútil
quanto o lustre do salão;
rebrilha tanta luz fútil
mas não vence a escuridão!
169
Mãe velhinha é como a luz
ofuscada na neblina...
orando, diante da cruz,
disfarça um sol de menina!
170
Lógica, seja o que for,
jamais com erros se envolve,
e mais, nas coisas do amor,
lógica nunca resolve!
171
A lógica vem depois
de um raciocínio sincero,
pois se um mais um somam dois,
você e eu somamos... zero!
172
Que sentido tem seu pranto
solto por quem não merece?
É acreditar em um santo
que não ouve a sua prece!
173
Periquito mentiroso
do realejo da pracinha;
me tira sempre, teimoso,
a sorte que não é minha!
174
Voltei à capela, em prece,
só para ver-te... não vi!
Até a saudade, parece
que não mora mais aqui!
175
No aconchego de um outeiro,
construí nossa choupana,
para, enfim, ter prisioneiro
teu destino de cigana!
176
Das estrelas, a neblina
toda a luz pode esconder;
mas a chama pequenina
dos teus olhos... posso ver!
177
Astronauta ao derredor
do infinito, em que me farto,
vi quanto o mundo é menor
que as paredes do meu quarto!
178
Bilac, inspirado amigo,
como posso ouvir estrelas?
Se nem amando consigo
nas noites ao menos vê-las?
179
O meu sonho, um passarinho,
de ramo em ramo faz festa...
mas só canta ao ter seu ninho
em cada ipê da floresta!
180
Buscando o amor vida afora,
o tempo a vida nos furta;
não é o amor que demora,
a vida é que é muito curta!
181
Quando o poeta faz seu verso,
é um pequeno Deus que chora
o infinito do universo
numa lágrima da aurora!
182
Volto aos braços do meu pai,
quando lá em casa ele passa;
qual circo, ele vem e  vai,
trazendo e levando a graça!
183
Vem, meu Papai Noel, vem
mesmo adulto, ainda anseio
pelo presente do além,
que esperei e que não veio!
184
A vida, um sonho bisonho,
vivi num sonho suicida,
sem saber se vida ou sonho,
sonho ou morte foi a vida!
185
Tua perfídia exorcizo,
nesta despedida louca,
ao beijar o teu sorriso
com perfume de outra boca!
186
De fato foi sortilégio,
o que fizeste comigo;
possuir-te, foi privilégio,
amar-te, foi um castigo!
187
Chega a noite e as Três Marias
dão-me o rumo caminhante
dos teus olhos, os meus guias,
para o nosso amor distante!
188
Consertando a hora perdida,
eu, que não via ponteiro,
acabei sendo, na vida,
aprendiz de relojoeiro!
189
Ao ver Deus nos olhos teus,
meu pai, tão cedo aprendi
a nunca pensar em Deus,
sem antes pensar em ti!
190
A velha foto, de fato,
é uma irônica maldade;
pois, ao ver-te no retrato,
não te vejo na saudade!
191
Se a mim mesmo às vezes minto,
a vida me contradiz;
quanto mais saudade eu sinto,
mais sinto que fui feliz!
192
Se a primavera começa
ao começar nosso amor,
venho, cumprindo a promessa,
trazer-te a primeira flor!
193
A aurora no mar, que aflora
tão infinita e tão bela,
é a mesma pequena aurora
que nasce em nossa janela!
194
Para o amor não há espera
nem idade para o amor,
só termina a primavera
ao murchar a última flor!
195
É noite e o lampião de gás,
que a saudade ainda ilumina,
nos surpreende, anos atrás,
nos beijando em nossa esquina!
196
Embora, a cara dos pais,
a netinha surpreendeu,
mostrando expressões iguais,
da avó que nem conheceu!
197
Poeta, a criar universos
de luz, de vida e esplendor,
Deus juntou todos seus versos
num só verso... e fez o amor!
198
O meu pai foi trovador,
o meu avô foi violeiro;
da viola herdei o candor,
da trova, o meu cativeiro!
199
Nem ganhando a liberdade,
deixo de ser prisioneiro,
pois se corro da saudade,
sempre ela chega primeiro!
200
- A morte é a grande alegria!
Dizia o pai, dedo em riste;
mas cedo cehgou seu dia:
- Meu pai, que alegria triste!
201
Enquanto o espelho reflete
minha imagem tão sofrida,
tua ausência se repete,
nos meus olhos refletida!
202
Sempre chorando e magoada,
pelo violeiro a cantar,
rachou-se a viola, cansada,
para nunca mais chorar!
203
Se a chama é a luz mais querida
ao coração de quem ama,
o amor é o tempo da vida
e a vida, o tempo da chama!
204
Ficou tão velhinho e aéreo,
que o seu olhar, sem aurora,
já mostrava o vulto etéreo
da sua vida indo embora!
205
Hoje, preciso ir atrás
da minha sombra perdida;
se achá-la, acharei a paz
que hoje falta em minha vida!
206
Sempre que parte um amigo,
meu mundo fica menor
e a dor que trago comigo
cada vez fica maior!
207
Luiz Otávio, tu partiste,
mas entre rosas e espinhos,
semeaste, no bosque triste,
trovas marcando os caminhos!
208
Nem com você num abraço,
nós dois ficamos a sós...
há sempre alguém nesse espaço
que ainda existe entre nós!
209
Quando se exige o carinho,
a solidão vem depois;
é melhor viver sozinho,
que viver sozinho a dois!
210
Se não perdi a esperança
de amar e de ser amado,
nesta espera não se cansa
meu coração já cansado!
211
O tempo é o rio a rolar
por entre pedras, a esmo;
a água está sempre a mudar,
mas o rio é sempre o mesmo!
212
Teus cascalhos, mão aflita,
revolvo, buscando, em vão,
achar uma só pepita
de ouro no teu coração!
213
A mãe pobre amava a espera,
pois o pai, na mão calosa,
lhe trazia a primavera
num simples botão de rosa!
214
Orvalho, lágrima pura
da madrugada que chora,
com pena da noite escura,
que o sol vai mandando embora!
215
Orvalho, gota de prata,
é a lágrima de ternura,
que o luar, em serenata,
faz chorar na noite escura!
216
Mesmo vendo a claridade,
não fujo à própria cegueira
desta minha liberdade,
dos teus olhos prisioneira!
217
Amo o teu ar de quem sonha,
quando escondes o desejo,
na pequenina vergonha
que afogas em nosso beijo!
218
O sol doirando a favela,
no morro, desprotegida,
pinta uma rica aquarela
da miséria colorida!
219
Se o homem enfim se conduz
e ilumina a escuridão,
por que não acende a luz
do seu próprio coração?
220
Na dança ansiosa das horas,
um galo que ninguém vê,
ao cantar, risca de esporas
mais um dia sem você!
221
Meu rancho, à beira do lago,
tem dois céus - um refletido,
e o verdadeiro, em que vago,
buscando o sonho perdido!
222
Ao abraçar-te, um segundo,
não há tempo nem espaço
mais infinito que o mundo
que envolvo no meu abraço!
223
Na minha raiva me afogo
e quero quebrar o mundo,
mas minha vida é que jogo
e que se quebra, no fundo!
224
A mor é vida aos matizes,
M anhã que eterniza a aurora;
O lhos chorando felizes,
R isos ternos de quem chora!
225
Meu pai é um velho carvalho,
protetor, sombras a dar...
mas basta a gota do orvalho
para fazê-lo chorar!...
226
A te esperar, na ansiedade,
devolvo a tua promessa...
e me encolho na saudade,
descansando a minha pressa!
227
Quando enfim eu te beijar,
após tão longo desejo,
terá valido esperar,
ainda que por um beijo!
228
Ao destruíres meu sonho
com requintes de maldade,
tua imagem decomponho
em sucatas de saudade!
229
Tu sorris, quero o teu beijo,
mas me contenho, indeciso;
como posso, num desejo,
desmanchar o teu sorriso?
230
Nasci na beira do rio,
suas águas me criaram;
e hoje me trazem o estio
das lágrimas que levaram!
231
Se antes de mim você dorme,
desperto-a, amor, sem clemência;
não suporto a dor enorme
da sua pequena ausência!
232
Ouça, filha... essa ciranda
lembra os seus primeiros passos!
E a saudade, na varanda,
volta correndo aos meus braços!
233
Meu bom cego, tenha calma,
não maldiga suas penas!
Ante as luzes que tem n'alma,
suas sombras são pequenas!
234
De volta ao teu coração,
amor, apenas te peço,
não cobres com teu perdão,
as causas do meu regresso!
235
Meu amor, eu te amo, te amo,
eu te amo, e se mais repito,
é mais amor que reclamo,
do nosso amor infinito!
236
Fazer anos, que alegria,
sempre volta o calendário;
todo dia é mais um dia
que completa aniversário!
237
No refrão do teu regresso,
eu confesso, solidão;
a paixão é um retrocesso
que não peço ao coração!
238
Se cultivei tantas flores
com primores e carinhos,
por que todos meus amores
não dão flores, só espinhos?
239
Você calou os meus versos,
minha voz, e eu sei por quê:
o meu talento disperso
também se foi com você!
240
Beija-flor de flor em flor,
na minha revoada louca,
só provei o mel do amor,
ao beijar a tua boca!...
241
Saudoso volto à tapera...
Quantas flores... e a lembrança
faz do inverno a primavera
dos meus sonhos d criança!
242
Eu nasci na primavera,
no verão eu me criei...
no outono fiquei à espera
do inverno em que te encontrei!
243
A máscara e a fantasia
tiraste, enfim... e afinal,
aprendi que o amor de um dia
só vale no carnaval!
244
Se há calor, felicidade
ou há mágoa e sofrimento,
a vida é uma eternidade
ou o sopro de um momento!
245
A verdade é como a estrela,
cintilante, cristalina...
pode a neblina escondê-la,
mas brilha além da neblina!
246
Mesmo após os vendavais,
o sabugueiro abatido,
para a festa dos pardais,
ainda chora... florido!
247
Ilusão, flor colorida,
que cresce sem ter raiz,
felicidade suicida...
de quem pensa ser feliz!
248
Sinto dos ventos o açoite,
te busco por toda parte!
Onde estás? Abraço a noite,
no vazio de abraçar-te!
249
Saudade, saudade amiga,
saudade a saudade invade,
saudade, saudade antiga
é a saudade da saudade!
250
Com paciência, o jardineiro
o espinho transforma em flor,
como transformo em canteiro
o nosso espinhoso amor!
251
No inverno, quando eu voltar,
depois de tão longa espera,
quero a flor do teu olhar
anunciando a primavera!
252
Se nada mais posso dar-te,
posto que tudo eu te dei,
devolvo-te a tua parte
dos beijos que te roubei!
253
De manhã, sem confessório,
já não vou mais à capela;
vejo a santa no oratório,
ao abrires a janela!...
254
Se meu coração, aos trancos,
não teve flores nem calma,
estes meus cabelos brancos
são as flores de minha alma!
255
Minha pomba de ternura,
ganha o espaço, rompe o véu,
leva o meu amor sem cura
a quem me espera no céu!
256
Quando moço eu era eterno!
Mas o tempo em seu conflito,
ao nevar no meu inverno,
fez murchar meu infinito!
257
A morte é um trem sem vigia,
que, embora sem direção,
acaba chegando, um dia,
em nossa própria estação!
258
Uma rosa cor de rosa
plante no seu coração...
e a vida abrirá, viçosa,
sorrindo em cada botão!
259
As luas, sem teu violão,
já não são as mesmas luas;
tu partiste... e a solidão
hoje é quem canta nas ruas!
260
A capelinha sem sino
foi o nada que restou,
do meu bairro de menino
que o passado desmanchou!
261
Tu sorris, esqueço o juízo
e com carinhos te forço
a desmanchar teu sorriso,
com meu beijo sem remorso!
262
Vês meu medo e, disfarçando,
te confesso sim, ter medo,
de que em segredo te amando,
tu descubras meu segredo!
263
Sem rumo na estrada adiante,
levando a saudade imensa,
quanto mais estás distante,
mais sinto a tua presença!
264
No retrato, anos depois,
meu pai, meu filho, a alegria,
também estou, entre os dois,
tirando a fotografia!
265
Abrindo a velha janela,
na praça, a lembrança explode:
vovô dando a manivela
no seu Fordinho Bigode!
266
Se quebrei meu violão
nas canções da mocidade,
guardo no peito o bordão
batendo surdo... a saudade!
267
De dia, o cão olha a lua
e late, pois tem certeza
de que é uma luz, que na rua,
alguém esqueceu acesa1
268
Seus olhos, noites que negam
aos meus olhos sua estrela;
mas se mais meus olhos cegam,
mais ainda eu quero vê-la!
269
Em nosso amor, como venta,
a roseira estala ao vento;
se a flor morre na tormenta,
eu morro no meu tormento!
270
Se a mágoa a vida abrevia,
tirando da vida a vida,
a vida a sobrar devia
ser vida sem dor vivida!
271
O vira-lata que passa,
com esperança olha mudo,
para a criança que abraça
seu cãozinho de veludo!
272
Se a catedral se revela
como o templo da oração,
Deus também benze a capela
dos simples de coração!
273
O nosso adeus tão singelo
foi nossa libertação...
tu ficas no teu castelo
e eu retorno à multidão!
274
O velho circo em desgraça,
que vai caindo aos pedaços,
ao partir, deixa na praça
a tristeza dos palhaços!
275
Eu seu pai, você menina,
dai-me de novo, meu Deus,
toda a emoção pequenina
dos seus dedinhos nos meus!
276
O palhacinho sem graça,
em vez de riso dá pena,
pois ainda é, por pirraça,
vaiado ao sair de cena!
277
O bom palhaço faz rir,
fingindo que a dor que sente
não sente, e que é só fingir,
para sentir-se contente!
278
Como a azaleia sem haste
flutua num copo d'água,
assim também me deixaste
flutuando na minha mágoa!
279
Num duelo que mortifica,
a língua a verdade lavra;
se eu minto e mentes, só fica
palavra contra palavra!
280
Tua palara tão mansa
nunca fere os meus ouvidos,
mas me machuca a vingança
dos teus gritos reprimidos!
281
Estrelas? Mal posso vê-las!
O luar tem tal magia,
que a noite esconde as estrelas,
pensando que ainda é dia!
282
Hoje, a seresta é de mágoa
e a janela não é tua...
mas, trincando a poça d'água,
eu vou pisando na lua!
283
As palavras já não tenho,
para pedir-te perdão,
e embora aos pedaços, venho
devolver teu coração!
284
Meu coração na agonia,
vazio do teu amor,
é um vaso sem serventia,
onde não nasce mais flor!
285
Se é você toda a mentira
na qual tanto acreditei,
com a verdade não fira
a mentira que eu amei!
286
A chuva no para-brisa,
na contraluz dos faróis,
parece o sol que agoniza
na noite, em pequenos sóis!
287
Trovadores a trovar,
cada qual faz o seu verso;
são pérolas de um colar
infelizmente... disperso!
288
Se ao partir deixo, te amando,
saudades nos olhos teus,
as tuas mãos me acenando
são carícias dando adeus!
289
No varal, o teu vestido,
que amassei louco e sedento,
qual vingança do tecido,
agora dança com o vento!
290
A chuva cai do beiral,
desfolha a flor no jardim,
se faz bem, também faz mal,
igual tu choves em mim!
291
À infância que o tempo evoca,
eu quis voltar, mas não pude...
rodando... entrei na biroca,
como a bolinha de gude!
292
Naquele verão vazio,
longe do teu coração,
nunca senti tanto frio,
estando em pleno verão!
293
Rodando a saída de roda,
girando ao sol a sombrinha,
como você me incomoda
e encanta enquanto caminha!
294
Chove a chuva e quando cai
se esconde na própria terra,
como o pranto do meu pai
no próprio peito se encerra!
295
Que seus olhos sinaleiros
não se fechem para mim,
se verdes, são meus luzeiros,
vermelhos, prantos sem fim!
296
Nosso amor, frágil cristal,
pouca coisa há que o consagre:
é impossível, por ser mal,
possível, por ser milagre!
297
Quando o inverno, mais sombrio,
tornar frio o amor eterno,
seja terno... e bem tardio
o estio do nosso inverno!...
298
O inverno chegou e o frio,
congelando todo o encanto,
fez um colar que eu desfio,
dos cristais do nosso pranto!
299
É outono e folhas douradas
acarpetam teu caminho;
sou assim, folhas magoadas,
que tu pisas com carinho!
300
A convite da lembrança,
à minha infância voltei...
e as vidraças de criança,
rebelde, outra vez quebrei!
301
Bem-te-vi do meu pomar,
bem me vês cantando assim;
voa, eu também sei voar
no céu que há dentro de mim!
302
Entra, formiga, te aceito
em meu canto sem canção;
mesmo cigarra, em meu peito
também mora a solidão!
303
Herege, nos prantos meus,
quase afogado entre escolhos,
te amo, e os meus olhos ateus
descobrem Deus nos teus olhos!
304
Felicidade são contas
que fiamos num colar;
se desatamos as pontas,
nada as pode segurar!
305
Se em meu rumo te atrapalhas,
te espalho, devagarinho,
meu coração em migalhas,
para indicar-te o caminho!
306
Meia-noite, olho as estrelas,
procurando o teu olhar,
inútil, não posso vê-las,
mudaste o céu de lugar!
307
Ao procurar, na ansiedade,
ser feliz na vida rota,
achei-te, felicidade,
mas servida em conta-gota!
308
O avô e a avó, no retrato,
sorrindo apesar da idade,
hoje parecem, de fato,
mais felizes... na saudade!
309
Pisca a estrela, e o vaga-lume,
amando-a, quer convencê-la
de que piscando o seu lume,
ele também é uma estrela!
310
Quanto mais fujo ao passado,
sem lembranças, solto a esmo,
mais me sinto encarcerado,
prisioneiro de mim mesmo!
311
Caiu a estrela cadente,
no horizonte se apagou!
Foi teu olhar inclemente
ou foi Deus que a derrubou?
312
Meus olhos são feitos de água
que se derrama num rio,
no qual seu barco de mágoa
navega sempre vazio!
313
A noiva, em braços errados,
quando o véu se descompôs,
chorou os sonhos jogados,
dispersos nos grãos de arroz!
314
Realizando o teu desejo,
te transformo em bibelô;
só não sei, quando te beijo,
se sou gente ou sou robô!
315
Por que me crivas de dor,
se apenas te dou carinhos?
Será por que, sendo flor,
esqueces que tens espinhos?
316
Esta cidade ferida,
por calúnias e maldade,
é dor, amor, morte e vida,
São Paulo, minha cidade!
317
Sou um louco trapezista,
salto sem medo os espaços...
mas sempre, ao final da pista,
caio outra vez em teus braços!
318
Gaspar loteia horizontes,
Melquior as virgens deflora,
Baltazar polui as fontes,
só Cristo, insepulto, chora!
319
Desperta a cidade em luz,
num calvário nunca visto;
em cada esquina uma cruz,
em cada cruz o seu Cristo!
320
Vendo - um terreno baldio,
cheio de entulho e raiz.
Preço - uma noite sem frio
ou um momento feliz!
321
Devolvendo-te a paixão,
vai meu último recado:
manda, urgente, o coração
que eu havia te emprestado!
322
Borboletas, tantas cores,
a brincarem no jardim...
são revoadas de flores
dançando em volta de mim!
323
No teu céu eu me desfaço,
como nuvem solta ao vento,
para ocupar todo o espaço
que existe em teu pensamento!
324
Gritei nos mares, nos portos,
no altar teu nome gastei...
achei os vivos... e os mortos,
mas nunca mais te encontrei!
325
Dom Quixote e São Francisco,
de cada qual tenho um pouco...
do santo, o pássaro arisco,
do andejo, os moinhos de louco!
326
Sol ferino, mar de escolhos,
os teus olhos de cristais,
mesmo cegando os meus olhos,
meus olhos não ferem mais!
327
Às vezes pequenos medos
assustam minha lembrança;
são fantasmas dos brinquedos
que quebrei, quando criança!
328
Tolice é insistir no errado
até que ele se consagre,
pois o vinho mal fechado
sempre termina em vinagre!
329
Ao chegar o fim da festa,
na casa desarrumada,
somente a saudade resta,
mesmo sem ser convidada!
330
Sem voo, perdido ao léu,
de volta ao teu coração,
mais que um pedaço de céu,
quero um pedaço de chão!
331
Depois do poente, a noite
traz a sombra que congela;
e espanta os sonhos no açoite
do vento em minha janela!
332
Partindo sem despedida,
levando todo o teu bem,
ao levares tua vida,
levaste a minha também!
333
Passei brincando na praça,
a infância, sem ver passar;
hoje, meu filho é quem passa,
brincando no meu lugar!
334
Tão bobos na casca do ovo,
eu menino, tu menina,
nos encontramos de novo,
descalços na mesma esquina!
335
Se te enterro, mais tu medras,
como as pragas no jardim;
saudade, és feita de pedras
que pesam dentro de mim!
336
Nosso amor de carnaval,
que infinita brincadeira...
prometeu ser imortal,
mas morreu na quarta-feira!
337
Numa aventura banal,
tu heroína e eu mocinho,
acabou sem ter final
a nossa história em quadrinho!
338
O grande amor que hoje sentes
é o mesmo que, quando em flor,
brincávamos inocentes,
sem saber o que era o amor!
339
Na quarta-feira profana,
depois do fim da folia,
a tristeza ainda me engana,
fantasiada de alegria!...
340
O antigo vaso sem flores,
nas cores dos seus cristais,
me lembra ainda os amores
que as flores não lembram mais!
341
Mãe coruja em seu anseio,
junto ao filho se enternece,
pois quanto mais ama o feio,
mais bonito lhe parece!
342
Tua carta eu recebi,
não abri, fiquei com medo,
pois queimando-a, preferi
não saber o seu segredo!
343
É manhã... o orvalho chora
no beiral da telha vã...
noite amiga, vai embora,
olha, chegou a manhã!
344
Tu és como a folha ao vento
que tento pegar em vão;
quanto mais pegar-te eu tento,
mais foges da minha mão!
345
Rasgaste folha por folha
nossas fotos, por vingança;
tudo em vão, pois sem escolha,
não rasgas minha lembrança!
346
Nossas brigas sem quartel
amargam nossa doçura;
se misturamos o mel,
veneno não se mistura!
347
Não chores o teu rancor,
pois o pranto, um desaforo,
não vale a gota de amor
que derramas com teu choro!
348
De tanto buscar lá fora
o sol na noite sem fim,
acabei achando a aurora
que havia dentro de mim!
349
No romance de miragens,
que juntou meu sonho ao teu,
somos simples personagens
que a nossa vida escreveu!
350
Vai no horizonte o veleiro,
qual desenho de criança,
que a borracha do nevoeiro
apaga até da lembrança!351
351
Se não leste o meu recado,
nada mais posso querer...
sou mais um livro empoeirado
na tua estante, sem ler!
352
No atacado e no varejo,
meu negócio é te beijar,
pois quanto mais eu te beijo,
mais beijos te quero dar!
353
Se após ter feito o malfeito,
quer dar jeito sem zum-zum,
dê um jeito com muito jeito
ou não dê jeito nenhum!
354
Numa corrente pequena,
um crucifixo pendente...
e uma saudade, que pena,
ingrata, matando a gente!
355
Não renegue o irmão malquisto
nem aos olhos negue a luz;
paz e amor, pregava Cristo,
não pregue Cristo na cruz!
356
Lembrando a voz do Evangelho,
meu pai dizia sorrindo,
que na esperança de um velho
há sempre um botão se abrindo!
357
Se em pizza tudo se encerra,
pois pizza é o que mais se come,
só uma coisa em minha terra,
não acaba em pizza... a fome!
358
Velho relógio parceiro
das tristezas e alegrias...
marcas, hoje, sem ponteiro,
as minhas horas vazias!
359
As gotas do teu veneno
vou sorvendo devagar;
vacinado e, enfim, sereno,
já não me podes magoar!
360
Minha primeira conquista,
a bonequinha de pano,
me deixou, sem deixar pista,
meu primeiro desengano!
361
Tu divides, não me oponho,
nossas coisas desiguais;
levas a casa, eu o sonho,
tu não vês, mas levo mais!
362
A caminho do arrebol,
fugindo à noite pagã,
se tu me levaste o sol,
por que deixaste a manhã?
363
À procura dos teus braços,
para entregar-te o carinho,
gastei todos os meus passos
mas não achei teu caminho!
364
A hora passa, multiplica,
num contínuo carrilhão,
mas se passa e a gente fica,
a hora volta e a gente não!
365
Ao partires, não te afoites,
nossas dores são irmãs...
mas leva contigo as noites
que plantaste nas manhãs!
366
Quando tu ris, inclemente,
meu coração não resiste;
se mais te vejo contente,
mais padeço, por ser triste!
367
Se em lágrimas de granizo,
choras sem nenhum decoro,
sofre mais quem num sorriso
esconde o seu próprio choro!
368
Sempre que um choro baixinho
nos olhos corre, inocente,
foi o frasco do carinho
que trincou dentro da gente!
369
Sendo o amor só falsidade,
nada há nele que me fira;
mesmo não sendo verdade,
eu amo a sua mentira!
370
Se a despedida foi fria,
descobri, logo depois:
dos dois levaste a alegria
e eu, a tristeza dos dois!
371
Não minta, não faça fita,
procure ser sempre assim;
toda a verdade é infinita,
toda a mentira tem fim!
372
Você chora, eu também choro,
o choro não nos faz bem,
gasta os seus olhos que adoro,
gasta os meus olhos também!
373
João e Maria, tristonhos,
nos bosques que nos perderam,
fomos migalhas de sonhos,
que os passarinhos comeram!
374
Menina, não perca a calma,
as mágoas duram instantes,
se o choro alivia a alma,
deixa os olhos mais brilhantes!
375
Se nosso adeus, gota d'água,
inundou teu coração,
te imploro, leva sem mágoa,
minha amizade de irmão!
376
Em sonhos, a te chamar,
em minha procura vã,
de que vale o despertar,
se me roubaste a manhã?
377
Vovó partiu outro dia,
velhinha, na flor da idade...
mas deixou sua alegria
até na dor da saudade!
378
A amizade é como o sol,
mesmo oculta na neblina,
sol maior ou sol bemol,
ainda é vida e ilumina!
379
Se a infância acabou tão cedo,
e os sonhos foram quebrados,
hoje a saudade é o brinquedo
que guardo entre meus guardados!
380
Nossa língua portuguesa,
flor do Lácio, eternidade,
é amor, avanço, é beleza,
numa palavra... saudade!
381
Minha rua leva à ponte
sobre um riacho sem fim
e o riacho ao horizonte,
que levou você de mim!
382
Menino azul, na distância,
brincando de esconde-esconde,
mostra onde está minha infância,
que escondeste não sei onde!
383
Meu irmão, que a morte encerra,
tristeza e orgulho me dás;
orgulho, por tua guerra,
tristeza, por tua paz!...
384
Vovó, dos netos rainha,
sorri com tal majestade,
que mesmo sendo velhinha,
não passa da flor da idade!
385
Não adianta madrugar!
Ninguém descobre o segredo!
Se mais cedo ouso chegar,
sempre alguém chega mais cedo!
386
Se atravesso o mar bravio,
tendo você como guia,
o mar se transforma em rio
e eu não sinto a travessia!
387
Atravesso a passos lentos
o umbral da casa vazia...
vou pisando os meus tormentos,
chão sem fim da travessia!
388
Se estou contente, te queixas,
se fico triste, nem ligas;
se existe amor, por que deixas
magoar-nos queixas antigas?
389
Prendes na gaiola o encanto
de um canário, por prazer,
mas o voo do seu canto,
esse, não podes prender!
390
Estrela guia, apareça,
mostre na noite os caminhos,
que cego, em minha cabeça,
trago a coroa de espinhos!
391
Marcha, soldado criança,
que a Pátria te quer rapaz,
que, adulto, plante a esperança
para a velhice de paz!
392
Ainda escuto a seresta
que cantamos ao luar;
hoje, é a saudade que resta,
cantando em nosso lugar!
393
Se o sofrimento é de fel
ou é pequena a ferida,
nossa dor é o aluguel
que pagamos pela vida!
394
O avião passa no horizonte
e, na ilusão da distância,
risca na crista do monte
o meu desenho de infância!
395
Perdeste o meu endereço,
eu também perdi o teu;
chegando ao fim, sem começo,
foi nosso amor que perdeu!
396
No olhar não posso contê-las,
tantas, no céu, a brilhar;
seus olhos, também estrelas,
não cabem no meu olhar!
397
Colha a flor, mas docemente,
sem causar à planta dor...
para que ela, humildemente,
possa lhe dar outra flor!
398
Eu fiz convite à saudade,
a dividir meu abrigo...
ela veio, e que maldade,
está acabando comigo!
399
Tambores! Circo! Final!
Sou vosso volante, vede!
Vou dar o salto mortal,
sem a proteção da rede!
400
Ao enfrentar o teu jogo,
no palco da nossa cama,
sou o engolidor de fogo
queimando na tua chama!
401
Perdão, amor, sem engodos,
sei porque te firo assim...
te protegendo de todos,
não te protejo de mim!
402
O homem, das trevas cativo,
sem perdão e sem calor,
acabou queimado vivo,
buscando a chama interior!
403
Com seu caráter indigno
e um desejo tão pequeno,
o pensamento maligno
destrói mais do que veneno!
404
Falou o Pai: - Bato à porta;
se alguém me abrir, der abrigo,
plantarei na sua horta
e o farei jantar comigo!
405
Marchando, Deus, sem destino,
com cabeça de papel,
sou Seu soldado menino,
voltando para o quartel!
406
O sol que nasce dourado
entre os montes, na distância,
é o mesmo sol encantado
dos meus desenhos de infância!
407
Sorte e azar foi nosso flerte,
bem e mal de amor, enfim,
pois sorte foi conhecer-te,
e azar, te amar tanto assim!
408
Foi de promessa em promessa,
que tu me envolveste assim!
Mas basta! Mesmo sem pressa,
promessa também tem fim!
409
Mal pagador de promessa,
temendo sempre o depois,
lhe devolvo, amor, sem pressa,
o que sobrou de nós dois!
410
Basta, amor, chegou ao fim
meu tempo de escravidão...
eu, que só dizia SIM,
agora sei dizer... NÃO!
411
Prometeste e não cumpriste,
mas teu beijo dado às pressas,
me deixou na boca triste,
saudade até das promessas!
412
Recebi o teu convite,
porém, não pude aceitá-lo;
se és princesa, tem limite
este meu amor vassalo!
413
A netinha ao acordar,
sentindo o sol, seus carinhos,
antes sorri... sem olhar,
só depois... abre os olhinhos!
414
Nosso castelo de areia
desmanchaste com teus pés;
por que, se bastava a cheia
do meu pranto, nas marés?
415
Nas pontas dos pés reluz
com tal graça a bailarina,
que o seu corpo me seduz,
mesmo fechada a cortina!
416
Enxuga o pranto, cantor,
volta, que a noite é de lua,
faz dueto com minha dor,
que ainda canta na rua!
417
Nosso amor foi tão algoz,
e o que passou tão ruim,
que ao tentar lembrar de nós,
não me lembro nem de mim!
418
Pátria... responde a cismar,
o pai, ao filho gentil...
Pátria é o amor, nosso lar,
do tamanho do Brasil!...
419
Para um sábio que duvida
porque pensa... com cuidados,
há mil tolos, sem medida,
que creem de olhos fechados!
420
Ao perder-te, mocidade,
nos anos que não vivi,
perdi também a saudade
que hoje eu teria de ti!
421
... E quando a morte chegar,
ainda quero o teu beijo,
para também sepultar
o meu último desejo!
422
Buscando o céu sem destino,
meu destino não perdoo...
sou pássaro peregrino
abatido em pleno voo!
423
Buscando minha alma gêmea,
cigarra de riso e pranto,
te achei, formiga boêmia,
encantada com meu canto!
424
Pés descalços, entre brasas,
sou o andejo sem caminho,
pássaro cego e sem asas,
que não acha mais o ninho!
425
Trabalhando a vida inteira,
porém, frustrada e sem garra,
sou formiga seresteira,
travestida de cigarra!...
426
Parabéns, filho, por teres
descoberto, do teu jeito,
que, com todos seus poderes,
o teu pai não é perfeito!
427
Soa a cigarra e me invade
o som da infância a brincar,
na lousa, altar da saudade,
do velho grupo escolar!
428
Foi um deslize
insensato
roubar-te um beijo... e depois,
insistir no simples fato
da culpa ser de nós dois!
429
Nos meus velhos embornais,
cheios de sonho e ternura,
se esperanças não têm mais,
saudades têm com fartura!
430
Mato a flor, quebro sem calma
teu vaso ornado e incomum;
mas dou-te a flor de minha alma,
que não cresce em vaso algum!
431
Negando a própria emoção,
avarenta, em teus desejos,
foste abrindo o coração
na fartura dos meus beijos!
432
Manhã... despertas contente,
minha noite vai embora;
és a aurora, eu sou o poente,
à espera sempre da aurora!
433
O mourão desta porteira
já foi árvore florida,
antes, sombra hospitaleira,
hoje, pranto e despedida!
434
À porteira e ao mata-burro,
voltei saudoso a lembrar...
e ela se abriu num sussurro,
lenta, querendo fechar!
435
Minha porteira criança,
meu parque de diversão;
aberta, minha esperança,
fechada, minha aflição!
436
Na encruzilhada do pranto,
nosso encontro, sem depois,
deixou fechar com seu canto
a porteira entre nós dois!
437
Carro de boi e a porteira
choram iguais só porque
foram feitos da madeira
do mesmo tronco do ipê!
438
Pela vereda enramada,
iam sonhos, um a um...
agora, estrada asfaltada,
não vai a lugar nenhum!
439
Tu foges nos teus desertos,
te alcanço, mas na abordagem,
busco os teus braços abertos
e abraço a tua miragem!
440
Sombra do povo apressado,
na contraluz do viaduto,
é um "kirigâmi" animado
mudando a cada minuto!
441
Conquistando ouro sem luz,
só poderes tendo em vista,
sete palmos e uma cruz
é o que terás por conquistas!
442
Nas vertigens da conquista,
galguei o teu coração;
tão alto, sou o alpinista,
com medo de olhar o chão!
443
Conquista é jogo de azar
e, no amor, jogo pesado;
querendo te conquistar,
eu é que fui conquistado!
444
Jovem, a vida é o teu bem,
faz da vida uma virtude,
que a velhice sempre vem
no melhor da juventude!
445
Na infância alegre, eu tristonho,
tu me olhavas a sorrir...
tua janela era o sonho
que eu nunca pude atingir!
446
Volto ansioso, a passo lento,
às veredas da saudade...
te chamo, mas flor ao vento,
tu não voltas, mocidade!
447
Eras minha prometida...
mas a vida, em sua pressa,
te levou da minha vida
sem ter cumprido a promessa!
448
Estradas levam ao mar,
veredas levam aos rios;
que atalhos devo tomar
para os teus braços vazios?
449
Agradeço a Deus a vida,
minhas dores, meus cansaços,
e as flores da despedida,
que não cabem nos meus braços!
450
A vereda leva à igreja
e ao teu coração, Maria,
onde a minha fé andeja
te achou e fez moradia!
451
Abro a trançada ramagem,
só veredas vão à fonte!
Se me escondeste a paisagem,
que fizeste do horizonte?
452
Te perdi pelas veredas,
entre ramagens e espinhos.
Onde estás? em que alamedas
escondeste os meus caminhos?
453
A mentira é como o avião,
que decola, e logo após,
não suportando a pressão,
explode e cai sobre nós!
454
Se não a escolhem, menina,
sorria e fique na sua...
a dança é breve e termina,
mas o baile continua!
455
Se sem ti me desespero,
as penas escondo a esmo,
pois, te querendo, não quero
sentir pena de mim mesmo!
456
Justiça que o pobre alcança,
cega, a nem todos faz jus,
pois nunca põe na balança
o peso oculto da cruz!
457
Abrindo o álbum dos afetos,
vovó conta a mocidade...
e nas fotos, sem os netos,
lhes ensina o que é saudade!
458
Não me concedeste a dança,
que esperei com ansiedade,
mas guardo ainda a esperança
dançando em minha saudade!
459
Numa dança de carinhos,
meus dedos dançam nos teus;
ao separar seus caminhos,
não sabem dizer... adeus!
460
Parabéns, ganhaste tudo,
meu coração aqui tens;
se me iludes, não me iludo,
é teu jogo... parabéns!
461
Toda a noite, ao toque ameno
da saudade a me acordar,
meu pranto é como o sereno,
verte mudo, sem chorar!
462
Dois lagos doces, sem jaça,
os teus olhos de cristal,
ao menor vento que eu faça,
transbordam gotas de sal!
463
No lago, o sol que agoniza,
reflete um céu tão fugaz,
que ao simples beijo da brisa,
estremece e se desfaz!
464
O rio agreste, em torrente,
chega à lagoa e se acalma,
tal qual minha alma fremente
se amansa junto a tua alma!
465
Tu sorris, com emoção,
mas a tristeza persiste...
e triste eu percebo, então,
que o teu sorriso é que é triste!
466
Mudou tudo na cidade,
o "Bixiga", o Nick Bar;
como matar a saudade,
se não tenho aonde voltar?
467
Simples nódoa no infinito,
mas que os humanos encerra,
ó, Deus, ouve o nosso grito,
preserva o planeta Terra!
468
A praça acordou em cores
e o orvalho, pingo por pingo,
pingou diamantes nas flores,
para a festa de domingo!
469
Ao lembrar-te, mocidade,
peço a Deus, em meu tormento,
não sendo alegre a saudade,
a graça do esquecimento!
470
Se a lua fosse apagada,
nem me faltava o luar...
teu sorriso é madrugada
e a luz vem do teu olhar!
471
Às minhas brisas tão francas,
teu céu azul se fechou;
sou pastor de nuvens brancas,
que a nuvem negra enganou!
472
Nossa vida é um sonho breve,
que exige eterno desvelo...
pois num descuido, o mais leve,
se transforma em pesadelo!
473
Se o bonde da Mocidade
passa veloz, não regressa,
o bonde Estação Saudade
passa lento, não tem pressa!
474
O teu regresso esperei,
saudoso, com ansiedade;
mas ao chegares, notei
que eu preferia a saudade!
475
Devolveste os meus sentidos,
minhas cartas, meu querer...
mas os meus sonhos perdidos,
tu não podes devolver!
476
Anjo é sempre uma criança?
O meu anjo é uma velhinha;
vovó beijando a esperança,
de um anjo novo... a netinha!
477
Retrato a cor, aos matizes,
nosso amor é um grande teatro;
pois éramos mais felizes,
branco e preto, três por quatro!
478
Se muita gente duvida,
só quem chega a Deus descobre,
que ser rico na outra vida,
é nesta ter sido pobre!
479
Menino só, na janela
da mansão que o morro encobre,
quer, vendo o amor na favela,
ser também menino pobre!
480
Com tanto amor na pobreza,
nosso lar era tão nobre,
que mesmo sem pão à mesa,
eu jamais me senti pobre!
481
Tu sorris e em ânsia louca,
ao beijar-te sem aviso,
mais que beijar tua boca,
quero beijar teu sorriso!
482
Fiz tanto feitiço errado,
buscando amores sem viço,
que acabei enfeitiçado,
atado ao próprio feitiço!
483
A mãe olha um berço... vindo
de um sonho da mocidade...
e a vida volta sorrindo,
gatinhando na saudade!
484
As nuvens correm aos ventos,
carneiros a pastorear,
tal qual meus olhos ciumentos
pastoreiam teu olhar!
485
Meu filho, após tantos anos,
só agora eu notei, enfim,
que herdando meus desenganos,
herdaste o melhor de mim!
486
Ontem, o sonho era um doce
com massa de amor recheada;
hoje, que bom se ele fosse
somente um doce... e mais nada!
487
Nos olhos calmos do lago,
encontrei o seu olhar...
foi seu reflexo tão vago
ou foi sobra do luar?...
488
Com meu cavalo de pau,
em nossa infância sem medos,
sempre eu vencia o anjo mau
que uqbrava os seus brinquedos!
489
Guri, coração de giz,
te amando ainda em segredo,
era fácil ser feliz,
em nosso amor de brinquedo!
490
Vida é um negócio ao avesso,
só dá lucro, quando passa...
quem compra sonho a bom preço,
leva saudades de graça!
491
Se espelha as ânsias do povo,
minhas ânsias não espelho,
pois sol novo do ano novo
é o mesmo sol do ano velho!
492
Quanta emoção na novela
do Rádio de antigamente -
o herói e a bela donzela
tinham as caras da gente!
493
Palhaço, a cara pintada,
por profissão é que faço;
mas tem gente que, por nada,
de cara limpa é palhaço!
494
Não tendo mais endereços
em minha própria cidade,
fiquei só, com meus avessos,
pedindo esmola à saudade!
495
Quando me olhas, fico cego,
pois, teu olhar de cristal,
se a mim faz bem eu não nego,
mas aos meus olhos faz mal!
496
Alguém bate à velha porta,
abro-a, entra meiga a saudade.
Abraço-a, ela me conforta,
ardendo de mocidade!...
497
Abro as mãos, detenho a vida,
que revida, fustigante;
e a vida, enfim, sem saída,
dá caminho e eu sigo avante!
498
Passa a vida e a mocidade,
se foi breve, não me contem...
só sei que apesar da idade,
me parece que foi ontem!
499
Não me aflija tanto assim,
não explore o meu perdão,
não exija sempre um SIM,
não me obrigue a dizer NÃO!
500
Se foi bela a mocidade,
mas tão breve se desfez,
conto contigo, saudade,
para vivê-la outra vez!
501
 
 
 
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ALGUMAS DE BOM HUMOR:
 
A maitaca deu um grito,
minha sogra respondeu:
-- Cala a boca, não admito
quem grite mais do que eu!
 
Vendo-a grávida, ele diz:
– Homem? Mulher? Que vai ser?
 E ela responde... feliz:
– Ele resolve... ao crescer!
 
Com fumaça em seu nasal,                 (Menção Honrosa em Peruíbe/SP - 2003)
se o vício não abandona,
médico que fuma é igual
ao padre que “vai na zona”!
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