Trovadores Inesquecíveis VII
ALYDIO C. SILVA
(texto de Thereza Costa Val, da UBT Belo Horizonte, para www.falandodetrova.com.br)
Com certeza não falarei o suficiente sobre o trovador que hoje focalizo. Sei que ficarei devendo alguma informação importante sobre ele. Acontece que não é fácil conseguir dados de alguém que já partiu há algum tempo. Os parentes mudam de endereço, o telefone não é mais o mesmo, e fica difícil o contato com os familiares. Entretanto, o que interessa é a homenagem que presto a quem a merece de fato.
Alydio integrou a UBT de Belo Horizonte desde os seus primórdios. Em 16 de janeiro de 1967, fez parte do grupo que se reuniu para a fundação da entidade. Dias depois, participou da festa de inauguração, integrando a primeira diretoria. Foi também um dos presidentes de nossa UBT. Frequentou com assiduidade a Seção, na época em que seu endereço era bem no centro da cidade, na sala da Academia Mineira de Trovas (AMT), de que também era associado. Depois, quando a UBT foi transferida para a União dos Varejistas de Minas Gerais, local arranjado por José César Rocha – marido de Lucy Sother de Alencar Rocha, que era Presidente da UVMG - Alydio continuou a marcar presença nas reuniões.
Discretíssimo, pelo menos à época em que o conheci, era de gentileza e educação aprimoradas, jamais entrando em questões polêmicas ou falando alguma palavra desagradável a quem quer que fosse. Tinha uma postura impecável. Reservava-se o direito ao silêncio, quando o assunto não o agradava. A única reação de desagrado que presenciei dele foi certa vez, após uma reunião na AMT em que alguns ânimos se exacerbaram. Na saída, ouvindo um comentário meu, confidenciou-me em voz calma e baixa: “Tenho muito prazer em comparecer às reuniões, mas deploro atitudes exaltadas. Saio de casa para me alegrar e não para me aborrecer...” Alydio já vivia o tempo em que a sabedoria comanda as atitudes. Sempre hei de lembrá-lo como um trovador respeitoso, comedido, tranquilo.
Dizia ter sido eletricitário de profissão. Era aposentado da Rede Ferroviária Federal. A atividade profissional lhe rendeu conhecimentos específicos interessantes, tanto que Alydio publicou em 1986 um livro de narrativas sobre situações vivenciadas no trabalho, chamado “Conversa na Intimidade”. Antes, já havia publicado o livro “Sempre Poesia”, em parceria com Carlos Alencar e José Machado Borges - em 1973.
Participou de diversas antologias e coletâneas, entre elas: “Trovadores do Brasil”, “Poetas do Brasil”, “Anuário” – Coletânea de trovas brasileiras, nos anos de 1977, 1978, 1979, 1980, 1981, 1982 – “Trovadores dos Seminários Nacionais de Trovas”, do RS. De Belo Horizonte, participou das coletâneas: “Mosaicos de Trovas”,“Veredas de Outono”, “Cantigas de Primavera”, “Horizonte em Trovas”. “Pórtico de Sonhos”, em 1998, foi a última coletânea da UBT/ BH que contou com sua participação.
Pertenceu a várias entidades literárias brasileiras, além da AMT e da UBT.
Alydio detinha um bom número de troféus, diplomas e medalhas, obtidos em diversos concursos realizados por todo o Brasil, como Niterói, Vitória, Colatina, Petrópolis, Jundiaí, Campos, Natal, Macaé, Vespasiano, Sete Lagoas, Belo Horizonte e muitos outros lugares.
Desde muitos anos, a UBT/ BH realiza concursos internos. Considero de valiosa importância esses concursos, pois dão oportunidade aos associados de se exercitarem e mostrarem suas criações. Foi a partir da participação em concursos internos que muitos de nossos trovadores cresceram e se tornaram vencedores, conhecidos nacionalmente. Alydio Silva participava costumeiramente dos nossos concursos, na década de 90. Também em 1990 foi criado o nosso boletim mensal “Horizonte em Trovas”, que continua ativo, oferecendo boa oportunidade para divulgação de trovas e informações sobre trovadores de Minas e do Brasil. Nos boletins antigos, tenho encontrado farto material para a composição dessas minhas páginas, inclusive sobre o trovador ora focalizado. Imagino quantas trovas maravilhosas ficam esquecidas, em páginas esparsas, difíceis de localizar, o que é, verdadeiramente, uma pena.
Alydio de Carvalho e Silva demonstrava preferência por algumas de suas trovas que transcrevo a seguir, compostas para atender a temas de concursos.
Declarar-te não consigo, O forró foi bom de fato,
minha paixão quase louca. no sítio do Manelão.
Se concordares comigo, tinha mais casal no mato,
falarei de boca a boca. do que dentro do salão.
Quando tu passas, menina, A festa de Santo Antônio
num jeito próprio da idade, não foi festa, foi festão;
tens uma graça felina mas virou um pandemônio
que envolve toda a cidade. pelo excesso de quentão!
Não há poeta ou pintor, Vi num jornal estampado
nem outro artista qualquer, o perigo que há no beijo.
que enalteça com rigor Antes ser contaminado
a perfeição da Mulher. do que morrer de desejo!
Mãe, figura destemida, Sobre as ondas onduladas,
que do sol ofusca o brilho. criaturas ondulantes,
Tem justiça definida mostram curvas bem tostadas
para defender seu filho. e relevos provocantes.
Veja que flor delicada No forró de madrugada
nasceu naquele quintal. na casa do Zé Clemente,
Uma jóia lapidada havia tanta umbigada,
pelo Mestre universal que o Zé gritou: pára gente!...
Meus longos anos de vida, Veja, amada companheira,
a natureza retrata, este quadro, que beleza.
mostrando a estrada vencida, Temos a família inteira
nos meus cabelos de prata. ao redor de nossa mesa.
Por tudo que aconteceu, Neste aceno tão comum
peço perdão, quanto posso; que fizeste na partida,
pois, sei que o gesto foi meu, eu fui apenas mais um
mas o pecado foi nosso. a ficar, na despedida.
A tristeza me persegue Quero um dia sempre assim,
todo instante, todo dia, para nós dois, ó querida:
mas, coitada, não consegue “sem crepúsculo e sem fim,
dizimar minha alegria. sem temor, sem despedida”.
As suas trovas de humor exibiam um humorismo leve, do jeito que convinha a um trovador discreto, de poucas falas, mas grande observador.
Alydio era casado com Maria Dirce Brandão e Silva, com quem tinha cinco filhos. Tinha verdadeiro orgulho de sua família que era unida e feliz Já em 1998, era avô de dez netos e bisavô de quatro bisnetos, hoje certamente belos rapazes e moças que seguem as tradições e exemplos recebidos.
Nasceu no Espírito Santo, na cidade de Santa Cruz, distrito de Aracruz, em 11 de abril de 1917.
Não consegui obter a data de falecimento de Alydio C. Silva, mas sei que o infausto acontecimento teve lugar em Belo Horizonte.
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OBS: Thereza Costa Val, integrante e importante dirigente da UBT de Belo Horizonte, tem resgatado, através desta coluna, a memória de importantes nomes da Trova que já não habitam entre nós.