Trovadores Inesquecíveis VI - Santos Teodósio

 TROVADORES INESQUECÍVEIS VI

(texto de Thereza Costa Val, da UBT Belo Horizonte, para www.falandodetrova.com.br)
SANTOS TEODÓSIO
(prosseguindo com sua brilhante série sobre "Trovadores Inesquecíveis", hoje Thereza Costa Val nos traz Santos Teodósio, mais um português que escreveu seu nome na história da Trova brasileira, e que muito influenciou na formação trovadoresca de Maria Madalena Ferreira, também portuguesa, residente em Magé/RJ)

 

     Santos Teodósio  foi outro trovador português de destaque na UBT de Belo Horizonte. No começo de suas participações, assinava as trovas usando o nome completo: Armindo dos Santos Teodósio.  Só depois de alguns anos, já conhecido por suas premiações, resolveu simplificar, passando a assinar somente o sobrenome. Muito espontâneo e comunicativo, procurava ter um bom relacionamento com todos da seção e com os demais trovadores do Brasil. Tornou-se bastante conhecido, pois costumava participar dos concursos e era frequentemente premiado, adquirindo um grande número de troféus, medalhas e diplomas. Comparecia com frequência às festas de premiação, entrosando-se  alegremente com o grupo.

 

          Muitas pessoas se referiam a ele como “o Brumadinho” porque Santos Teodósio era Delegado da UBT em Brumadinho, onde residia, sendo o único trovador da cidade, localizada na região metropolitana. Pela facilidade de vir a Belo Horizonte e para manter contato com os trovadores, fato que ele muito apreciava, Brumadinho era presente em todas as nossas reuniões mensais.  Participava dos concursos internos e deixou trovas suas nas seguintes coletâneas da UBT/BH: “Horizonte em Trovas”,  “Entre Montanhas e Trovas” , “Pórtico de Sonhos”. Além de nossas coletâneas, entre outras, teve trabalhos seus publicados na coletânea de escritores elistas “Elos Palavra” e na coletânea “Valores Literários do Brasil”.  Em “Pórtico de Sonhos”, publicou trovas em francês, inglês, espanhol e italiano, demonstrando bom conhecimento desses idiomas.

 

         Apesar de ter alcançado inúmeras premiações, sendo um trovador  inspirado  e produtivo, Santos Teodósio, assim como tantos outros trovadores, não deixou um livro de trovas publicado.  Afirmo e reafirmo que acho importante a participação em coletâneas  organizadas pelas UBTs, já que muitos trovadores não conseguem, não se empenham  ou mesmo não se interessam em publicar um livro da própria autoria. Entendo que a palavra publicada é resguardada para sempre. Quem trabalha com a palavra, obviamente,  deseja tornar conhecido o que faz. Hoje, a internet é grande divulgadora, porém, continuo acreditando que o trabalho impresso nunca perderá seu espaço. Os livros com resultados de concursos são excelente meio de divulgação. Melhor ainda quando os trabalhos são reunidos em coletânea ou em livro individual, pois fica mais fácil encontrar as produções  de um poeta, trovador ou escritor, quando se busca notícia sobre ele.  Digo por mim, que tenho buscado esse recurso  para  compor minhas páginas.

 

         Nascido em Cartaxo, Portugal, em 1935, criado em Lisboa, Armindo dos Santos Teodósio veio para o Brasil em 1954, com 19 anos. Não manteve o sotaque acentuado dos portugueses.

 

        Encontrei-o em diversas festividades da trova. Uma dessas ocasiões foi em Nova Friburgo, em 1995, quando ele teve uma trova premiada com a 1ª Menção Honrosa - 6º lugar - em lirismo, no tema “Poeta”. Teodósio estava feliz, pois ainda não havia sido premiado na bela cidade serrana do Rio de Janeiro. A trova com que conseguiu a almejada classificação foi:

                                   Não tive tudo o que quis
                                   da vida, que foi madrasta,
                                   mas sou poeta e feliz
                                   e apenas isto me basta! 

 

         Sabemos que “o poeta é um fingidor”, como afirmou o famoso poeta português   Fernando Pessoa,   porém,  pelo que  conheci de Santos Teodósio, o 3º verso  dessa trova  e até mesmo o 4º,  traduzem  um lado verdadeiro de sua vida.
 

        Outra trova que destaco é a que ele fez começando os quatro versos com a letra inicial  de seu nome. Não havia tema específico no concurso de Campinas: a exigência era que o trovador concorrente iniciasse cada verso com a primeira letra de seu nome. Santos Teodósio abusou da letra s. As três palavras do primeiro verso da trova  premiada   são  também  começadas com  S:

Somos seres semelhantes      
seguindo os mesmos caminhos,           
solitários  caminhantes          
sempre em  busca de carinhos. 

         O “Brumadinho” tinha outros pendores artísticos: além de poeta e escritor, era compositor e cantor. Musicou alguns de seus poemas, interpretando-os com voz  boa e afinada.   

         Exercia  a atividade  de Representante  Comercial.                                      

         Em  lirismo  ou humorismo,  o trovador lusitano tinha  o dom de se sair  bem. Suas  trovas de humor eram imbuídas de um humorismo  “sadio” – aquele que nos faz  rir  sem causar constrangimento.  Na verdade ele era assim, até nas conversas. Às vezes, era um pouco ferino.  Lembro-me  da vez  que Teodósio esteve em minha casa e conheceu  Ravengar, o belíssimo gato angorá  de minha estimação. Ao ver que eu exibia o gato como um troféu, sorriu ironicamente.  Pouco depois, quando soube  que eu me tornaria  avó, aconselhou-me: “Agora  que você vai ser vovó, Thereza,  pode jogar aquele gato fora...”   Estranho conselho  que nunca esqueci! Vou levar em conta que foi uma simples brincadeira...

 

         Entre as  inúmeras  trovas líricas e humorísticas de Santos Teodósio selecionei  as  que se seguem:          

 

         Depois da louca paixão                            Devorada a costelinha

         que tanto nos fez sonhar,                         o prato do “seu” Silvério

         tranquei o meu coração...                         - de tantos ossos que tinha -

         Joguei a chave no mar!                            parecia um cemitério! 

 

         Subo  a montanha  da vida:                     Neste verão esquisito

         minha alegria é sem par...                       o calor que faz, faz dó:

         mas eu sei que é na descida                    galinha põe ovo frito
         que a vida nos faz chorar!                       e vaca dá leite em pó! 

 

        As gaivotas adejando                               Mesmo estudando “direito”

        sobre o porto, na partida,                         em três Universidades,      

        lembram  saudades bailando             tornou-se um doutor suspeito

        em gestos de despedida...                 de “ sofrer das  faculdades”!

 

         Na tristeza que me invade                       Por ter feito confusão  

         de uma paixão extinguida...                     com “cafetão de gravata”

         sou montanha de saudade                       alguém deu um pescoção

         na cordilheira da vida!                             no “capitão de fragata”...

 

         Choraste na despedida                            Com trabalho não me iludo,

         e eu não chorei, mas depois,                   pois quero vida folgada...

         tanta saudade sentida                              Eu juro que farei  tudo

         fez-me chorar por nós dois!                     para jamais fazer nada!

 

        Aparências enganosas                             Meu   barraco na favela

        levaram-me  a descaminhos...                 possui riquezas  em penca...       

        Se nadei em mar de rosas,                       _ Uma porta, uma janela 

        naufraguei  em mar de espinhos!          e lá dentro a minha “Encrenca”!    

 

         Perdoe e não hostilize                              Essa é boa, com  certeza.

         a quem se sente culpado...                      Telegrama  português:

         Quem peca por um deslize                       _Eu chegarei de surpresa

         merece ser perdoado!                              quarta-feira, dia três.

 

         Um trovador alegre, animado e bem relacionado, um bom amigo nos momentos difíceis dos companheiros trovadores, Armindo dos Santos Teodósio, depois de sofrer mais de um AVC,   perdeu  o contato com o mundo. Contudo, durante o longo período de sua enfermidade, teve  a assistência constante da esposa e do filho único, ambos dedicados  e carinhosos.  Faleceu em Belo Horizonte, em 24/ 04/ 2007.

 

        Santos Teodósio não promoveu concursos ou outras atividades na cidade onde era Delegado da UBT, em razão das conhecidas dificuldades de enfrentar sozinho a organização e realização de um concurso. Todavia, pelas inúmeras premiações que obteve e de seu alegre comparecimento aos encontros  de trovadores, Armindo dos Santos Teodósio conseguiu tornar bem conhecido o nome de Brumadinho no cenário da trova.

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