TROVADORES INESQUECÍVEIS - XI
DINA MANGABEIRA
(Texto de Thereza Costa Val, UBT Belo Horizonte, 09/05/2011)
Por muito tempo conheci a Dina sem saber que esse não era seu nome verdadeiro e, sim, um nome adotado literariamente. Dina era um nome que lhe caía muito bem: suave, vivaz, curto, simpático. Se o nome define ou revela a pessoa, esse foi muito bem escolhido. Tão bem serviu para ela, que assim Bernarda Carvalho de Rezende ficou conhecida não só como escritora, embora seu nome de nascimento fosse também bonito, elegante, além de ostentar tradições no sobrenome.
O nome Mangabeira, que ela juntou ao Dina, tinha origem familiar: era um apelido dado a seu avô paterno, Raimundo José de Carvalho, tradicionalista em Montes Claros, que industrializava leite de mangabas dos mangabais que arrendava das fazendas do Norte de Minas e da Bahia para vender às fábricas de borracha.
Dina frequentava a UBT, a Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais e a Academia Feminina Mineira de Letras, entidades sediadas em Belo Horizonte, como Membro Efetivo. Da AFEMIL era sócia fundadora, primeira ocupante da cadeira de número 10. Era presença agradável, amiga, que distribuía sorrisos e simpatia. Na Academia Municipalista, representava o município de Montes Claros. Fazia parte, também, de outras Academias fora de Belo Horizonte, como Membro Correspondente, inclusive da Academia Montesclarense de Letras.
Era natural de Bocaiúva, MG, nascida em 20 de agosto de 1923, numa fazenda chamada “Morro Agudo”, de propriedade de seu pai, Manoel José de Carvalho, conhecido como Neco Mangabeira.
Aos dois anos de idade, com seus pais e irmãos, Dina mudou-se para Montes Claros, onde moravam todos os seus parentes paternos e maternos. Naquela cidade do Norte de Minas, a garota fez o curso primário, depois o curso de Adaptação e o Normal. Após a conclusão do Normal, Dina lecionou no Instituto Norte Mineiro de Educação. Em 1946, casou-se com Aílton Roza Rezende, funcionário do Banco do Brasil. Dois anos depois, deixou o magistério para cuidar da casa, marido e dos filhos que pretendiam ter. Tiveram quatro: três homens e uma mulher; e ainda, três netos.
Em Montes Claros, Dina residiu com a família até seus cinquenta anos de idade. Nesse tempo, seu marido pediu transferência do banco e eles se mudaram para Belo Horizonte. Na Capital, Dina sentiu-se à vontade para exercitar seu amor pela literatura, aproveitando seu tempo livre de dona de casa. Lia muito e escrevia bastante. Enviava seus artigos para jornais e revistas de Montes Claros e Belo Horizonte. Com os artigos publicados, seu nome tornou-se conhecido. Dina foi convidada para ingressar na AFEMIL e na Academia Municipalista. Em Belo Horizonte, há um bom relacionamento entre as entidades culturais e logo Dina ingressou também na UBT. Sempre disposta, animada, muito responsável, ela foi chamada a colaborar e prestou relevantes serviços como Vice-Presidente de
Finanças da UBT e Tesoureira da Academia Feminina, sendo também Relações
Públicas da Academia Municipalista, entrosando-se perfeitamente com os membros das entidades que frequentava.
Bernarda Carvalho de Rezende publicou dois livros, sob o nome literário de Dina Mangabeira: “No Palco Real da Vida” - Contos e Crônicas – 1986 - e “À Sombra do Passado” - Poemas – 1990.
Participou de várias publicações da Academia Feminina Mineira de Letras: em 1985, 1993, 1994 e outras.
Teve trovas suas publicadas nas Coletâneas da UBT/ Belo Horizonte: “Horizonte em Trovas”- 1991 - “Além do Horizonte” – 1996.
Recebeu várias medalhas, sendo a de maior honraria a Medalha Santos Dumont, do Governo de Minas Gerais.
Como escritora, Dina tinha preferência por crônicas e contos, cujas tramas tecia muito bem, além dos artigos em jornais. Como poetisa, elaborava versos de poemas livres, de sua preferência. Não se prendia muito às rimas e métricas do soneto.
Gostava de fazer palestras e falar seus poemas e trovas. Enfim, dedicava-se inteiramente às atividades literárias, frequentando assiduamente as três entidades de seu coração.
Somente pude encontrar trovas de Dina Mangabeira nas coletâneas acima mencionadas. Eis algumas:
Tu já não me olhas, por quê? No langor do fim do dia,
Não sejas fingido assim... quando o sol já é poente,
Somente um cego não vê há uma invasão de agonia,
o quanto gostas de mim. matando a alma da gente.
Abusei na juventude. Quando desatar o laço
Fiz da vida o que bem quis do presente que lhe dei,
e, em razão dessa atitude, não deixe cair o abraço
hoje, sou muito infeliz. que dentro dele enviei.
Sem ligar à tua dor, Se você for humilhado,
ingrata fui, ó Jesus! não se vingue – é ser igual:
De ti recebi amor pense em Deus crucificado
e em paga o preguei na cruz. por quem não fez nenhum mal .
O trovador tem magia Na vida sou como a artista
quando ele fala de amor; que ao tear vai tricotando
faz trova com harmonia e, como uma estrategista,
e ainda a enfeita com flor seu destino vai trançando.
Se eu pudesse lhe daria, Da saudade fiz um laço,
ó minha mamãe querida, com muito amor e carinho!
da fórmula da alquimia E quanto mais laços faço,
o elixir da longa vida! de saudade me definho.
O tempo vai, tempo vem, Hoje, vou dar-te um abraço
e eu, à espera no portão, apertado de tal jeito
fiz da espera meu refém, que do gesto deixo um laço
do tempo, a desilusão. ilustrado no meu peito.
De cinzas pintei a testa, Acabou num triste fim
quarta-feira da paixão; o que foi sonho e beleza.
maquiei-me para a festa Teu amor morreu em mim
da linda ressurreição. por eu ver nele a incerteza.
O homem, por ser machão, “Mineiro não diz, sussurra.”
aos gritos, diz o que quer, Assim falava meu pai;
mas, mansinho, lambe o chão “Nem usa cofre, usa burra
onde pisa uma mulher. só por ser mineiro, uai!”
Dina Mangabeira era uma trovadora chamada “novata” ( em nossa UBT/BH temos Novatos e Veteranos - divisão simbólica que nada tem a ver com idade, mas com o fato de ter maior ou menor experiência como trovador) e demonstrava muito gosto e dedicação pela trova. Trovadora entusiasmada e amiga de todos, ela merece estar relacionada entre nossos trovadores inesquecíveis.
Seu falecimento ocorreu em 11 de fevereiro de 2000, na cidade que adotou como sua, apesar de seu inegável amor por Montes Claros. Por amor a Belo Horizonte, ela até disse, numa trova, uma pequena e inocente mentira, quando se comemorava o centenário da Capital Mineira:
Sou feliz, água de fonte
de sonora corredeira.
Nasci em Belo Horizonte,
a centenária Mineira.
================================================
THEREZA COSTA VAL, brilhante trovadora mineira nascida em Viçosa e residente em Belo Horizonte: amiga e colaboradora do "Falando de Trova".