José Firmo Cavalcanti - Pernambuco

 JOSÉ FIRMO CAVALCANTI, ou simplesmente José Firmo, nasceu na Fazenda Riachozinho, município de Pedra / PE, em 24 de maio de 1903.  De família paupérrima, morando em lugar desprovido de recursos, aprendeu as primeiras letras com sua tia Santina, que era poetisa. Juntando o que lhe era nato, com o incentivo que então passou a receber, tornou-se um poeta/trovador de rara inspiração, conforme o atestarão seus versos abaixo.  Lançou três livros:  “Pomos Verdes”-1955, “Folhas Mortas”-1962 e “Sonetos e Trovas”, em 1970. Sempre com recursos próprios e distribuídos gratuitamente, a amigos e amantes de poesia.
     Foi Delegado da União Brasileira de Trovadores em Pedra, sua cidade natal.

 Da saudade não se explica
esta ambigüidade estranha:
tanto fica com quem fica
como ao que parte acompanha.

 Muito pequei; mas por isso
não devo ser condenado:
- A culpa foi do feitiço,
da doçura do pecado.

 Cegos de amor e desejo,
meus lábios nunca souberam
que teu beijo era sobejo
dos beijos que outros te deram. 

Vejo agora, ao fim da vida,
que perdi meu tempo com
a confiança desmedida
e o desejo de ser bom. 

Mal vou um sonho deixando,
arrependido e descrente,
vou logo os olhos fechando
para sonhar novamente.

 Parti... Ficaste calada,
o teu lábio estava mudo;
mas, mesmo sem dizer nada,
para mim disseste tudo. 

Quem a sofrer não esteja,
na vida ninguém conhece:
todo vivente deseja
e o que deseja padece.

 Hoje, que estou velho e feio,
uma coisa que me irrita
é ver este mundo cheio
de mulher nova e bonita. 

O jogo, unido à cachaça,
num concubinato imundo,
é geratriz da desgraça,
que anda espalhada no mundo. 

Quem julga pela aparência
e a todos quer condenar,
vive na triste iminência
de mortalmente pecar. 

Casou com mulher bonita,
sem ter por ele ninguém...
- Que quantidade infinita
de amigos ele hoje tem! 

Hoje estou vivendo o drama
do fim de um amor que eu tive:
- Coração que já não ama
é coração que não vive. 

Fui dormir em ti pensando
e então contigo sonhei;
mas, quando vinhas chegando,
eu, por desgraça, acordei. 

Foi Deus que assim me formou:
não gosto de imitação.
Prefiro ser como sou
a ser como os outros são. 

Caso fossem, de repente,
presos todos os ladrões,
onde se acharia gente
para guardar as prisões? 

Enquanto há cego que lê
e entende o que se lhe diz,
outro, com vista, não vê
um palmo além do nariz. 

Por que no orgulho te abrasas,
homem?  - Por que esta  ambição?
- De que te servem as asas,
se tens de andar pelo chão? 

Enterrei, para uma prova,
um sonho meu que morria;
depois vi que em sua cova
uma esperança nascia. 

Tenho uma inveja perfeita,
sinto um despeito sem fim,
lendo uma trova bem feita
que não foi feita por mim. 

Dinheiro, do mesmo jeito
que o remédio a se dosar,
se é pouco, não faz efeito;
se é muito, pode matar.

 Quem tem amor tem tormento,
receio, cuidado e zelo;
mas assim mesmo eu sustento:
pior que tudo é não tê-lo. 

Casar a todos faz medo
porque se diz com alarde:
- quando é moço – “é muito cedo”,
- quando é velho – “é muito tarde”. 

O “SIM” é palavra breve
e boa de proferir;
mas dizê-la, ninguém deve,
sem primeiro refletir. 

Acho graça, fico rindo,
ao saudar um velho, quando
ele me diz: “eu vou indo”.
Devia dizer: “voltando”. 

De nada ser me convenço
quando de tudo me privo,
e em não viver como penso
fico a pensar como vivo. 

No mundo tanto dinheiro
correndo de mão em mão,
e os filhos do sapateiro
andando de pés no chão. 

Há muita gente propensa
a se tornar infeliz,
porque diz tudo que pensa,
mas não pensa no que diz.

As tuas mãos delicadas
são alvo dos meus desejos:
eu sonho vê-las calçadas
com as luvas dos meus beijos. 

Quanto mais no que é terreno
meu pensamento aprofundo,
mais gosto de ser pequeno,
de não ser nada no mundo. 

Como é que alguém me convence
da fraqueza da mulher,
se uma só que me pertence
faz de mim tudo o que quer? 

Dei tanta crença ao meu sonho,
com ele me acostumando,
que se hoje a sonhar me ponho
nem sonho que estou sonhando.

 Mal das mulheres não digo,
mesmo se uma me ofendeu:
Se elas se zangam comigo,
quem perde tudo?  Sou eu! 

Falo contigo, intranqüilo
fico depois, sem saber
por que não te disse aquilo
que mais queria dizer. 

Certa noite, a lua, vendo
nossa amorosa intenção,
entre as nuvens se escondendo,
nos deixou na escuridão.

Ganha em ser cega a Justiça,
pois, não sendo, era capaz
de chorar, vendo a injustiça
que em nome dela se faz. 

Resta cinza unicamente
do nosso passado amor;
mas ele foi tão ardente
que a cinza inda tem calor. 

Há, da existência na lida,
contraste em todos os meios:
- Uns andam cheios de vida,
outros da vida estão “cheios”. 

Costume que me pertence
e em todo tempo foi meu:
não bato palma ao que vence
nem zombo do que perdeu. 

Sem mais ilusões, tristonho,
pergunto a mim, noite e dia:
- “Como viverá sem sonho
quem só de sonhar vivia?” 

Se tens fé, terás a graça
que Deus te dá, com certeza,
de ser feliz na desgraça,
de ser rico na pobreza.

 Acalmando alheias dores,
semeando amor e carinho,
poderás mudar em flores
as pedras do teu caminho. 

Lutando desde menino,
não consegui ser feliz:
Meu destino, meu destino,
qual foi o mal que eu te fiz? 

Pobre não é, com certeza,
quem na pobreza está bem;
pobre é o que, tendo riqueza,
sempre quis mais do que tem. 

Queres ser feliz?  Semeia,
por onde andares, o Bem.
- A felicidade alheia
pode ser tua também. 

Nenhum prazer se compara
ao desvelado prazer
da mãe que o berço prepara
ao filho que vai nascer. 

Seja a boca cautelosa
quando a verdade profere,
que a verdade, como a rosa,
tem sempre espinho que fere.

Se cresceste em posição
e se venceste na vida,
nunca te esqueças da mão
que te amparou na subida.

Ninguém conteste a mulher,
que é sempre caso perdido;
faça logo o que ela quer
e está tudo resolvido!