A bênção, Mestre Waldir!

Escrevi esta página no primeiro semestre de 2006, logo após receber um telefonema do Magnífico Trovador Waldir Neves, meu ídolo e meu maior incentivador na Trova. Ele já estava há um pouco de tempo adoentado e tivemos uma conversa telefônica muito emocionante.
Em agosto eu o encontrei nos festejos da UBT Rio de Janeiro. Foi quando conversei com ele e o abracei pela última vez, foto esta que mantenho guardada como uma relíquia.
Em janeiro de 2007 recebo a terrível notícia de sua partida. Fiquei de entregar-lhe esta página e acabei por não fazê-lo. Mas valeu pela homenagem que lhe fiz, de coração aberto.

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A SUA BÊNÇÃO, MESTRE!

WALDIR NEVES! "Que sonetista, que trovador brilhante!" – dirão muitos. "Que ser humano extraordinário!" – dirão todos. Pois para mim esse homem superou todas as barreiras: deixou de ser simplesmente um homem e transformou-se em mito!
Não estou aqui a falar de Waldir Neves simplesmente porque ele foi o primeiro "monstro sagrado da Trova" a debruçar-se sobre o meu trabalho e tecer, a respeito, rasgados elogios. Aliás, nesse episódio, o "meu trabalho", no caso, resumiu-se a duas trovas. Não mais que isso. Foi em 1999. Era, na realidade, meu primeiro ano participando efetivamente dos concursos nacionais. Em Barra do Piraí fui vencedor, no tema "Fantasia", com:
A luz da noite ilumina
o olhar da menina aflita
que fita a luz da vitrina
e fantasia o que fita!
E dois meses depois, em Niterói, venci no tema "Fortuna":
Não há fortuna guardada
que pague o gesto de quem
divide o seu quase nada
com outro que nada tem.
Waldir foi julgador em ambos os concursos, e deu nota dez às duas composições. E, segundo depoimento de outro grande trovador, Héron Pa
trício, ele teria dito que "esse rapaz ainda ganhará muitos concursos".
Profecia ou não, o fato se consumou, embora a princípio eu não confiasse muito. E, desde então, já acumulei quase duas centenas de classificações.
Bem, fechando o enorme parênteses e retornando ao início, lembrei-me, de repente, vasculhando meu acervo trovístico e relembrando momentos agradabilíssimos vividos em marcantes solenidades, que as duas situações que mais fortemente me emocionaram foram proporcionadas por esse maravilhoso poeta nascido no Rio de Janeiro a 10 de junho de 1924.
Em 2004, quando obtive o 1º. lugar em Nova Friburgo, seguindo a tradição eu teria que apresentar um discurso em trovas. E o fiz, falando de meus antepassados, todos nascidos em Friburgo, desde que a família chegou ao Brasil em 1819. Para minha surpresa, houve grande comoção na platéia. Muita gente foi às lágrimas. Mas uns quinze minutos depois de tudo terminado, já do lado de fora, encontrei o mestre Waldir que, ainda de olhos vermelhos, abraçou-me muito e disse: "Ouverney, você me fez viver minha maior emoção nos meus quarenta anos de Trova."
E em abril de 2006, logo após o almoço, tocou o telefone de minha residência e, ao atender, logo reconheci sua voz. Ligou especialmente para me dizer que gostava muito de uma trova minha, sobre saudade: "Na minha opinião, meu caro Ouverney, essa sua trova sobre saudade é a melhor que conheço!" E se pôs a declamá-la. Chegando ao segundo verso sua voz embargou e o pranto veio. Só depois de algum tempo, já recomposto, ele terminou de falar essa trova com a qual eu premiara em Pinda, em 2002:
Saudade: expressão mais bela
de tudo que já se foi...
É como abrir a janela
ao passado e dizer: "Oi"!
E a grande verdade é que a lembrança de seu choro me faz chorar. Para mim Waldir Neves sempre foi, é e será o verdadeiro Mestre, na acepção do termo. Poucos poetas descreveram a saudade como ele o fez. Tão grande no talento quanto na humildade; tão inigualável em bondade quanto em inspiração. Meu eterno incentivador e, acima de tudo, meu amigo incrivelmente fiel.
WALDIR NEVES! Que sonetista, que trovador brilhante! Mas, princi-
palmente, que ser humano extraordinário! A sua bênção, meu Mestre!!!

Pindamonhangaba, abril de 2006