Aureliano Alves Netto - postado em 30.04.2010

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(texto de José Fabiano, mineirim de Uberaba)

Aureliano Alves Netto

(14/09/1914 a 07/10/2004)

 

     A respeito de Aureliano Alves Netto, transcrevo parte do artigo “Meu encontro com o Sr. Aureliano Alves Netto”, de Dâmocles Aurélio, publicado no site Lampadário Espírita (www.lampadarioespirita.com), de Recife, PE, de 26/04/2010:

     “Nascido no dia 14 de Setembro de 1914, na cidade de Candeúba (BA) e desencarnado no dia 7 de Outubro de 2004, em Caruaru / PE. Autor de 22 livros espíritas e de centenas de artigos publicados quer em jornais e revistas espíritas, quer em jornais não espíritas. Colaborador de ‘Reformador’, ‘Estudos Psíquicos, de Lisboa, Vita Nuova, de Milão e Divulgación Espírita, de Madrid. Seus textos primam pela exatidão de conceitos doutrinários e pela linguagem clara, de forma concisa, num português escorreito. Dentre sua bibliografia, destacam-se: Extraordinárias Curas Espirituais’, ‘Extraordinários Fenômenos Espíritas’, ‘O Espiritismo Explica’ e ‘A Visão Espírita dos Fatos’.

     Sua biblioteca contendo mais de dois mil livros foi doada pela família para o Lar Espírita Chico Xavier, no bairro de Candeias, Jaboatão/PE.

     Filho de pais católicos, mas praticamente criado com os avós, igualmente católicos. Teve a sua atenção despertada para os estudos espíritas, ainda criança, nos tempos da escola primária, quando o seu professor passou a inculcar na sua mente as primeiras noções de um assunto pouco compreendido e pouco falado em sua terra natal. O menino franzino ouvia as preleções do velho professor, que falava de ‘visões’, de ‘Espíritos que aparecem’, de ‘coisas do outro mundo’. Essas ‘lições geravam apreensões no menino de 14 anos de idade, mas sua mãe, viúva, e seus avós, não contradiziam esses ‘conhecimentos contrários ao catolicismo.

     Os horizontes de Condeúba, que ainda não cheiravam a petróleo nem descortinavam riquezas petroquímicas, encurtavam, na visão do rapaz estudioso dos ‘problemas espíritas, obrigando-o a buscar, mais longe, campos mais extensos e estradas mais largas. Por isto, certo dia, pegou um Ita no Norte e ‘foi pro Rio morar. Deu adeus aos seus colegas da prefeitura de sua terra natal, onde era funcionário, e deixou parente. Na Cidade Maravilhosa (ainda era Capital do Brasil), submeteu-se a concursos públicos, sendo aprovado, para escrevente da Casa da Moeda. Não aceitou a nomeação, porque, concomitantemente, se classificara, também, em primeiro lugar, no concurso de escrivão de coletoria federal, sendo nomeado. Passou pouco tempo, logo depois foi primeiro lugar no concurso de coletor federal e, mais tarde, ainda através de concurso, vinha a ser Agente Fiscal do Imposto de Consumo, aposentando-se, anos depois, já em Caruaru, na função de Agente Fiscal de Tributos Federais.”

 

     Assim apresentado, transcrevo-lhe a seguinte carta a mim endereçada, em 18/10/1985:

Caruaru, Pernanbuco, 18, outubro, 985

 

              Prezado José Fabiano,

 

              Agradeço, sensibilizado, o envio do seu excelente livro ‘Caixinha de Trovas.

              Vai a croniqueta que escrevi a respeito. Acredite que manifesta meu pensamento com a maior sinceridade. Acho que as suas Trovas são, realmente, da melhor qualidade.

              Publicarei a croniqueta aqui no semanário ‘Vanguarda. Mandar-lhe-ei depois o recorte.

              Continuando aqui ao seu dispor, abraça-o cordialmente o amigo e admirador

                                                                                    Aureliano Alves Netto

 

     Eis a seguir, a croniqueta anunciada, publicada no jornal “Vanguarda”, de Caruaru, PE, no dia 03/11/1985:

TEIA DE PENÉLOPE / CAIXINHA DE TROVAS

              ‘A trova, pela sua singeleza, é uma espécie de exteriorização poética da alma do povo.’ – Aparício Fernandes

              Observa, com sua reconhecida autoridade trovadoresca, o poeta Eno Teodoro Wanke: ‘Justamente por ser curta, a trova é difícil – a boa trova, bem entendido -, pois exige habilidade para sintetizar.’

              Sem dúvida. A trova perfeita é delicada filigrana de ourivesaria poética. Os que sabem fazê-las são mestres do ofício, apaniguados dos deuses do Parnaso: são cidadãos de dois mundos. Um pé na Terra, outro na imensidão etérea.

              E vivem assim, felizes e conformados. Há um deles, bípede implume de Platão, que, benevolente, aconselha:

Contenta-te com o que és,

Sem inveja de ninguém.

Em ti, valem mais dois pés

Que, na centopéia, os cem.

 

              O gentil conselheiro que engendrou essa trovinha é o menestrel uberabense José Fabiano, residente em Belo Horizonte, que nos obsequiou com um exemplar do seu livro CAIXINHA DE TROVAS, editado em 1984 pela Imprensa Oficial de Minas Gerais.

              A ‘Caixinha’ é um verdadeiro relicário, que reúne 100 pequeninas gemas de fino lavor, isto é, 100 trovas de excelente qualidade.

              Como bem acentua o prefaciador Fausto De Vito, a poesia de José Fabiano, ‘abrangendo o gênero lírico e o gênero didático, ora reflete o sentimentalismo e a prudência, ora a crítica e a graça’.

              Queremos assinalar somente o aspecto pitoresco e deliciosamente satírico da obra, mesmo porque o espaço não nos permite ir além.

              Já dizia Horácio: ‘QUE IMPORTA DIGAMOS A VERDADE A RIR?’ José Fabiano reza pelo catecismo horaciano.

 

              Senão vejamos:

              Execrando o alcoolismo:

 

A bebida, que permite

Enganosa alacridade,

Depois de certo limite

Vira soro da verdade.

 

              Aí está admiravelmente retratada a locução latina IN VINO VERITAS.

              Exprobrando a falsa modéstia:

 

Quanta gente não se ilude

E como que se acostuma

A supor grande virtude

Dizer que não tem nenhuma.

 

              Combatendo a proliferação da mendicância:

 

Na ajuda ao necessitado,

Sugiro-te esta postura:

Não lhe dês pronto o melado:

Antes dá-lhe a rapadura.

 

              É a mesma recomendação da sabedoria chinesa: ao faminto, não se dê o peixe, e sim o anzol para fisgar o peixe.

              Conceituando a equidade da Justiça Divina:

 

Ante Deus, somos iguais.

Nenhum de nós Ele adula.

Diferente de outros pais,

Deus não tem filho caçula.

 

              Apontemos também, umas trovinhas, nas quais a gente se deleita com o inteligente sentido das palavras:

 

Talvez rireis ao saberdes

Como eu me sinto em apuros,

Se pousais os olhos verdes

Em meus olhos já maduros.

 

***

 

Se tempo se perde tanto,

Diga-me, aqui, ao ouvido:

Em que lugar, em que canto

Posso achar tempo perdido?

 

***

 

Envelheço e, se o lamento,

É porque tenho motivo:

Vejo chegar o momento

De enfrentar a morte... ao vivo!

 

***

 

Nem todos os indolentes

São inúteis e imaturos:

Madeira, quando em dormentes,

Os trilhos torna seguros.

 

              Esse José Fabiano é um ‘senhor’ trovador, não acham os prezados leitores? Sua CAIXINHA DE TROVAS guarda um tesouro que a traça não rói e o larápio nem pensa em roubar... porque o tem de graça.

 

                                       Aureliano Alves Netto