Thalma Tavares - ex-presidente da UBT São Paulo

          THALMA TAVARES (pseudônimo literário de Vicente Liles de Araújo Pereira), hoje residente em São Simão/SP, nasceu em Recife, a 12 de julho de 1934. Mudou-se em 1953 para São Paulo, onde concluiu os estudos e fixou território. Foi, por muitos anos, presidente municipal e estadual das UBTs Estado e Cidade de São Paulo. Com a mesma desenvoltura, passeia pelos mais variados gêneros de  poesia. É uma das referências maiores na Trova brasileira.
 

Galgar os Céus!... Eu não tenho merecimentos pra tanto... Quebrei as asas no empenho de me tornar homem santo.

Se o destino desaprova
minha ilusão desmedida,
eu ponho ilusão na trova
e sigo iludindo a vida.

Saudade sem esperança
é berço sem serventia...
É brinquedo sem criança
na casa triste e vazia.

Coração, nunca te emendas!...
És de fato um sonhador.
Até nas duras contendas
tu vês motivos de amor!

Este perdão que me negas
por 'um nada" que te fiz,
é mais um cravo que pregas
na cruz de um peito infeliz.

Velhice é mal que persiste
se a vida é trilha enfadonha...
É sombra invadindo triste
o espaço de quem não sonha.

Minha rua é uma alegria,
tem crianças, risos, gritos...
E se chama – que ironia!
Alameda dos Aflitos.

Eu não maldigo a pobreza,
mas tento me levantar.
Quando Deus preside a mesa,
qualquer pão é caviar.

Quando a saudade se esconde
pelos confins da cidade,
eu tomo em sonhos um bonde
e vou matar a saudade.

Mato as tristezas cantando.
Curti-las não vale a pena.
Cantando vou me livrando
da mágoa que me envenena.

Das bofetadas que a vida
me deu sem muita piedade,
tu foste a mais dolorida
e a que mais deixou saudade.

Por dar crença ao teu sorriso,
que tantas paixões atiça,
construí um paraíso
sobre areia movediça.

Enquanto o teu ventre sofre,
menino de muitas fomes,
teu patrão guarda no cofre
o lucro do que não comes.

Quixote demais propenso
a crer num Bem mais profundo,
eu faço da Trova um lenço
que enxuga os prantos do mundo.

Bravura é viver sorrindo,  (1.lugar SP 1987 conc.-relampago)
embora seja evidente
que a vida é dor insistindo
em ser mais forte que agente.

No aceno discreto e mudo
que entre lágrimas fizeste,
teus olhos disseram tudo
do amor que nunca disseste.

Quem lê vive mais completo,
anda sempre iluminado...
Há mais luzes no alfabeto
que no Céu todo estrelado.

Faço troça de alguns travos
quando a vida sabe a fel;
quebro entraves, tiro agravos
pondo trovas no papel.

Carícia em forma de prece
que no ocaso vou rezando,
o teu beijo é sol que aquece
um outro sol se apagando.

- És meu príncipe! - dizia
vovó com seu jeito doce...
Tão doce que eu me sentia
como se príncipe fosse.

Que festa! O neto correndo,              (Menção Especial Niterói - 1991)
fingindo ser um robô,
erguendo os braços, dizendo:
- “Eu vou te pegar, vovô!”...

O amor mais forte se faz,
quanto mais se pensa nisto:
Servindo ao Cristo da Paz,
teremos a Paz de Cristo.

Bailarinas transparentes,
as gotas do meu olhar,
dançam tristes, reticentes,
o “pás-de-deux” dos sem par...

O teu adeus foi inverno
que fez o sol ir-se embora...
Meu poente fez-se eterno
e eu nunca mais tive aurora.

O luar branco alumia,
pela fresta da janela,
a face escura e vazia
de minha noite sem ela.

O meu coração protesta
contra um adeus sem juízo                        (Menção Especial Niterói - 1991)
que tirou de minha festa
a festa do teu sorriso.

Conto os segundos, querida,
que passo longe de ti...
Detesto tanto a partida
que penso que não parti.

Mensagem vívida e terna
que um ardente amor traduz,
o teu olhar é lanterna
que ilumina a própria luz.

Os teus olhos peregrinos,
com seus encantos fatais,
são dois poemas divinos,
são demônios celestiais...

O sonho acabou... E embora
eu aceite a realidade,
vivo os encantos de outrora
no agora desta saudade.

Foi Mãe Preta alforriada
pelo afeto do senhor.
De tanto afeto cercada
morreu escrava do amor.

No eterno circo da vida,
grande proeza é viver
na corda bamba estendida
entre o nascer e o morrer.

Rica e doce Língua minha
feita de arrulhos e brados,
és mãe, fadista e rainha
cuja voz canta meus fados!

Te dizes tão deserdada
que eu, que do nada venho,
desejo unir o teu nada
ao tudo que já não tenho.

Sobre teu colo perfeito,
cintila um Cristo de prata,
mas levas dentro do peito
um demônio que maltrata.

Em silêncio a criatura
mais perto de Deus se faz.
Por isso, cala e procura
encher teu mundo de paz.

Quando estás distante eu penso
e chego a crer que é verdade,
que a solidão fez o lenço
para enxugar a saudade.

Tenho na vida uma meta:
não lembrar mais do que é triste.
Quem lembra o triste, vegeta,
não vive, apenas existe.

Em nossas doces lembranças
vejo-me ainda o menino
que ao tocar em tuas tranças
uniu ao teu seu destino.

Se alguma dor te entristece,
Levanta-te, abre as janelas!...
E no fervor de uma prece
deixa Deus entrar por elas.

Na terra do Zé Coronha
o amor parece novela:
- a Zefa namora a Tonha
e o Zé o marido dela.

Enquanto altiva deslizas
sobre meus tristes apelos,
eu, sozinho, invejo as brisas
que afagam os teus cabelos.

Não se mede o bom artista
pelo pouco que mostrou:
Quem me conhece “de vista”
não sabe ao certo quem sou.

Velha gangorra querida,
eu não mudei, sou menino...
No sobe e desce da vida
quem me balança é o destino.

Numa pétala orvalhada,
uma gota luminosa
é um beijo que a madrugada
deixou na face da rosa.

É tão lindo o seu sorriso!...
Seu beijo é tão perfumado,
que aqui vou, perdendo o siso,
cometer mais um pecado.

Em minha vida sem graça
de sonhador solitário,
a madrugada não passa
de um por-do-sol ao contrário.

- Qume plantou e colheu flores
para os sonhos enfeitar,
conhece o trilho das dores...
Sabe onde tem que pisar!